sábado, 26 de janeiro de 2019

O INFERNO É AQUI...

Rompe-se a veia. A barragem é imaginação tardia, que não veda, nem estanca. Jorra por impulso desmedido o sangue convertido em lama. Que sufoca, que esmaga, que aniquila paisagens e vidas em labirintos de horror. Rejeitos descartados servindo agora como mortalhas ensandecidas. Almas consumidas na lama; a mesma lama erigida como altar das fábulas humanas. O cotidiano desfeito como nervo exposto e pela veia aberta. Dor, imensa dor.


(fotos da ruptura da Barragem B1 da Mina Córrego do Feijão - Brumadinho/MG)

OREMUS! (26)

A sequência destes pensamentos e reflexões são publicados diariamente na Página OREMUS da Biblioteca Digital do blog.

26 DE JANEIRO

Sempiternus Pontifex aedificat vos [o Pontífice Eterno vos engrandeça]

Assim escreveu, aos seus fiéis, o grande bispo dos primeiros séculos, São Policarpo: que o Pontífice eterno, Cristo, edifique a vossa santidade, in fine et veritate, in mansuetudine, in patientia, in castitate [ao final e verdadeiramente, pela mansidão, pela paciência, pela castidade]. Que maravilhoso programa de vida sacerdotal!

In fide et veritate [pela  fé e pela verdade]. É com Nosso Senhor que devemos erguer o edifício da nossa santidade sobre as verdades da fé, sinceramente apegados ao Pai que está nos céus. In mansuetudine, in patientia [pela mansidão, pela paciência] essa norma do nosso apostolado. Ser, para todos, um reflexo da misericórdia de Nosso Senhor, com uma paciência alegre e perseverante, porque vivemos expectantes beatam spem [na expectativa de nossa esperança feliz (Tt 2, 13)], conforme diz o Apóstolo.

In castitate [pela castidade]: a sinceridade com Deus nos dará a inocência e a reta intenção em tudo, com um santo respeito a nós mesmos e às almas. Não será demais, se realizarmos, em nossa vida sacerdotal, esse programa de santidade que o grande bispo apresentava aos simples fiéis do seu tempo. Não podemos construir sobre outra base, a não ser essa: In fide et veritate [pela fé e pela verdade] — porque omne quod non est ex fide, peccatum est [tudo o que não procede da fé é pecado (Rm 14, 23)].

(Oremus — Pensamentos para a Meditação de Todos os Dias, do Pe. Isac Lorena, 1963, com complementos de trechos traduzidos do latim pelo autor do blog)

OS TRÊS MORTOS

No Evangelho (São Lucas 7, 11-17), encontramos três mortos ressuscitados pelo Senhor de forma visível, e milhares de forma invisível. A filha do chefe da sinagoga (Mc 5,22ss), o filho da viúva de Naim e Lázaro (Jo 11) são símbolos dos três tipos de pecadores ainda hoje ressuscitados pelo Senhor. A menina ainda se encontrava em casa de seu pai, o filho da viúva já não estava em casa da sua mãe, mas também ainda não estava no túmulo, e Lázaro já estava sepultado. 

Assim, há pessoas com o pecado dentro do coração mas que ainda não o cometeram. Tendo consentido no pecado, ele habita-lhes a alma como morto, mas não saiu ainda para fora. Ora, acontece amiúde aos homens esta experiência interior: depois de terem escutado a palavra de Deus, parece-lhes que o Senhor lhes diz: 'Levanta-te!' E, condenando o consentimento que dantes haviam dado ao mal, retomam fôlego para viver na salvação e na justiça. 

Outros, após aquele consentimento, partem para os atos, transportando assim o morto que traziam escondido no fundo do coração para o expor diante de todos. Deveremos desesperar deles? Não disse o Salvador ao jovem de Naim: 'Eu te ordeno: Levanta-te!'? Não o devolveu a sua mãe? O mesmo acontece a quem atuou desse modo: tocado e comovido pela Palavra da Verdade, ressuscita à voz de Cristo e volta à vida. É certo que deu mais um passo na via do pecado, mas não pereceu para sempre. 

Já aqueles que se embrenham nos maus hábitos, ao ponto de perderem a noção do próprio mal que cometem, procuram defender os seus maus atos e encolerizam-se quando alguém lhos censura. A esses, esmagados pelo peso do hábito de pecar, albergam as mortalhas e os túmulos e cada pedra colocada sobre o seu sepulcro mais não é do que a força tirânica desse mau uso que lhes oprime a alma e não lhes permite, nem levantar-se, nem respirar. 

Por isso, irmãos caríssimos, façamos de tal modo que quem vive viva, e quem está morto volte à vida e faça penitência. Os que vivem conservem a vida e os que estão mortos apressem-se a ressuscitar.

(Sermão 98, Santo Agostinho)

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

RETRATOS DE NOSSA SENHORA (I)


Ecce Mater Tua - Aí tens a tua Mãe


Entremos na casa da Virgem Maria Menina. De seus pais nada nos diz o Evangelho. A tradição conta-nos que se chamavam Joaquim e Ana e que eram já de idade avançada. A Igreja venera-os nos seus altares e a razão nos diz que tiveram de ser muito santos. Aquela Menina era a obra mais preciosa da Santíssima Trindade, e Deus tinha que a pôr em mãos muito seguras...Os pais de Maria tiveram de ser muito santos também.


Maria foi menina... Foi menina e teve em grau muito elevado a virtude característica das crianças, a inocência que se refletiu no seu rosto. Foi menina e crescia como as meninas... crescia e crescia como um sol que sobe até ao zênite sem encontrar nuvens no caminho. Crescia a Virgem menina e crescia ao lado de sua mãe, como devem crescer todas as meninas.


A Santíssima Virgem, como todas as suas companheiras, vivia no templo afastada do mundo, cultivando no retiro a flor delicadíssima da sua pureza. Vivia longe das diversões mundanas, longe do trato com os homens, cultivava também as virtudes que são defesa, floração e complemento da pureza: o pudor e a modéstia.

Quis Deus que presenciasse a morte de seus próprios pais, que estivesse a seu lado naqueles momentos tristes, e sentisse a emoção dos que vão e dos que ficam, porque todos os cristãos lhe haviam de pedir para estar também a seu lado na hora da morte, e com a experiência própria compreenderia melhor a necessidade da sua presença nesses momentos. Maria jovem foi órfã de pai e mãe.


A pincelada mais certa para o retrato de Maria jovem, deu-a o anjo ao sondar Maria: És a cheia de graça. Este é o seu traço característico; o que desenha a sua fisionomia interna e a diferencia de todas as pessoas. Este é o seu nome específico, que só a ela se pode aplicar, nome que é a expressão de uma excelsa realidade: a cheia de graça. Maria jovem tinha a alma cheia de graça, e por isso Deus estava com ela, vivia naquela alma: O Senhor é contigo.

(Textos: excertos da obra 'Retratos de Nossa Senhora, de Juan Rey, 1957, trad. M.V. Figueiredo)

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

PALAVRAS AO HOMEM ETERNO

1. Onde quer que estejas, e para qualquer lado que te voltes, miserável serás, se não te convertes a Deus. Em tudo pondera o fim, e de que modo te apresentarás ante o rigoroso Juiz, a quem nada é oculto, que não se deixa aplacar com dúvidas, nem admite desculpas, mas que julgará segundo a justiça. Insensato e mísero pecador, que responderás a Deus que conhece os teus crimes, tu que tremes diante do vulto de um homem irado? Por­ que não te acautelas para o dia do juízo, quando ninguém poderá ser excusado ou defendido por nenhum outro? Agora o teu trabalho é frutuoso, as tuas lá­grimas são bem acolhidas, os teus gemidos são ouvidos, a tua dor é expiatória e meritória.

2. Aqui tem grande e salutar purgatório o ho­mem paciente que, recebendo injúrias, mais se dói da maldade de quem lhe ofende do que da própria ofensa; que de boa vontade ora pelos seus inimigos, perdoando do intimo do coração os agravos; que não tarda em pedir a outros perdão; que mais facilmente se deixa levar à misericórdia do que á ira; que faz violência a si mesmo, esforçando-se por submeter a carne ao espírito. Melhor é purgar agora os pecados e extirpar os vícios que deixá-los para serem extirpados na outra vida. Por certo nós mesmos nos enganamos pelo amor desordenado que temos à carne.

3. Que outra coisa devorará aquele fogo se­não os teus pecados? Quanto mais te poupas agora e segues os apetites da carne, tanto mais severamente serás depois atormentado, fazendo maior reserva de combustível para te queimar. No que mais tiveres pecado, nisso mais severa­mente serás castigado. Ali os preguiçosos serão incitados por agui­lhões ardentes, e os gulosos serão atormentados com sede e extrema fome. Ali os impudicos e voluptuosos serão submergidos em abrasado pez e fétido enxofre, e os invejosos uivarão como cães furiosos.

4. Não haverá nenhum vicio que não tenha ali o seu particular tormento. Os soberbos serão acabrunhados de toda a sorte de confusão, e os avarentos reduzidos à misérrima penúria. Uma hora de suplício ali será mais insuportável que cem anos da mais rigorosa peni­tência aqui. Ali não há sossego nem consolação alguma para os condenados, enquanto aqui às vezes cessam os trabalhos, e somos aliviados por amigos. Tem agora cuidado e dor dos teus pecados para que no dia do Juízo estejas seguro com os bem aventurados. Porque então estarão os justos com grande confiança diante dos que os angus­tiaram e perseguiram. Então se levantará, para julgar, Aquele que agora se sujeita humilde­mente ao juízo dos homens. Então terá muita confiança o pobre e humilde; não assim o soberbo que, de todos os lados, estremecerá de pavor.

5. Então se verá, como fora sábio neste mundo quem aprendeu a ser menosprezado e tido por louco, por amor de Jesus Cristo. Então dará prazer toda a tribulação, sofrida com paciência, e a iniquidade será reduzida ao silêncio. Os que foram dados à piedade, se encherão de alegria, e os irreligiosos de tristeza. A carne então mais se regozijará de ter sido mortificada, do que se fora sempre nutrida em delícias. Então resplandecerá a roupa vil, e a vestimenta preciosa ofuscar-se-á. Então será mais exaltada a simples obediência, do que toda a astúcia do século.

6. Então se alegrará a mais a pura e boa consciência do que a filosofia dos sábios. Então se estimará mais o desprezo das riquezas do que todos os tesouros dos ricos da terra. Então te consolarás mais de haver orado com devoção do que de haver comido com regalo. Então te aproveitarão mais as boas obras do que as mui­tas e lindas palavras. Mais agradará então a vida austera e a rigorosa penitência do que to­das as delícias terrenas. Aprende agora a sofrer um pouco para que possas livrar-te de coisas mais penosas. Experimenta primeiramente aqui o que poderás receber no outro mundo. Se agora tão pouco queres padecer, como poderás suportar tormentos eternos? Se agora o menor incôm­odo te torna tão impaciente, que fará então o inferno? Sem dúvida, não podes ter duas ven­turas: deleitar-te aqui no mundo, e depois rei­nar com Jesus no Céu.

7. Se até hoje sempre tivesses vivido em hon­ras e deleites, que te aproveitaria, se agora mesmo tivesses de morrer? Vaidade tudo, pois, que não for amar e servir somente a Deus. Decerto os que amam de coração a Deus, não temem a morte, nem o suplício, nem o juízo, nem o inferno, porque o perfeito amor tem segura recepção com Deus. Mas quem se deleita ainda em pecar, não admira que tema a morte e o juízo. Todavia, se não te desvias do mal pelo amor, convém ao menos que o faças pelo temor do in­ferno. Porém aquele que despreza o temor de Deus, não poderá perseverar no bem, antes ca­irá muito depressa nos laços do demônio.

8. Que pode te dar o mundo sem Jesus? Estar sem Jesus é terrível inferno; estar com Jesus é doce Paraíso. Estando Jesus contigo, nenhum inimigo te poderá ofender. Quem acha a Jesus, acha um grande tesouro, ou antes um bem su­perior a outro qualquer. Quem o perde, priva-se de muito mais do que de um mundo inteiro. Viver sem Jesus é reduzir-se à extrema pobreza; estar bem com Jesus é tornar-se sumamente rico. Preferível é, pois, ter todo o mundo por inimigo que ofender a Jesus.

9. Confessarei, pois, contra mim mesmo a minha iniquidade; confessar-Vos-ei, Senhor, a minha fraqueza. Vede, Senhor, a minha fragilidade e abatimento que melhor conheceis que eu mesmo. Compadecei-Vos de mim e tirai-me desta lama, para que nela eu não fique atolado e submergido. O' fortíssimo Deus de Israel, zelador das almas fieis, dignai-Vos olhar para os trabalhos e dores do vosso servo e de assisti-lo em tudo. Ro­bustecei-me da força celestial para que não me vença e domine esta carne miserável, ainda re­belde ao espírito, e contra a qual convém com­bater enquanto vivemos neste desgraçado mundo.

(lmit. 1. 22, 24; II. 8; III. 20)

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

FOTO DA SEMANA

'A terra estava sem forma e vazia; as trevas cobriam­ o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas' (Gn 1, 2)