sábado, 26 de novembro de 2016

QUESTÕES SOBRE AS TENTAÇÕES E O PECADO (III)


Questão 25: Pode Deus nos tentar?

'Que ninguém, ao ser tentado, diga: ‘É Deus quem me tenta’, porque Deus não pode ser tentado para o mal, nem tentar ninguém' (Tg 1, 13).  Este versículo nos ensina duas coisas: a primeira é que Deus não pode ser tentado. Por que o que pode oferecer a tentação a Deus que Ele já não tenha? Que benefício, que prazer ou satisfação que se pode oferecer que Ele já não possua? Em Deus, a tentação é metafisicamente impossível, pois esta não tem nada a oferecer. A segunda coisa que o versículo nos ensina é que Deus não tenta a ninguém. Deus é bom e, por isso, não pode nunca tentar para o mal. Deus só pode conduzir ao bem, nunca nos apresentando o mal como bem ou nos induzindo ao erro. Se Deus não pode ser tentado, por que o diabo tentou Jesus? Porque foi Deus feito homem que podia ser tentado. Assim como também é impossível para Deus sofrer, ainda que Deus encarnado pudesse sofrer.

Questão 26: Por que Deus permite a tentação?

Se Deus não nos tenta, por que permite a tentação? Encontramos a resposta no seguinte versículo: 'Considerai que é suma alegria, meus irmãos, quando passais por diversas provações, sabendo que a prova da vossa fé produz a paciência' (Tg 1, 2-3) Sem a tentação, não existiria essa constância na virtude que resiste uma e outra vez contra toda a tentação sedutora. Em outras palavras, há determinados tipos de virtudes que jamais poderiam existir sem uma resistência às tentações. E mais, quanto mais dura for a prova, maior a luz da virtude ao superar a tentação.

Isto nos leva a pensar no seguinte: Deus poderia ter confrontado os demônios de modo que eles nunca pudessem interferir na história humana. Porém, Deus sabia que os demônios, se de um lado seriam causas de males, por outro lado ofereceriam ocasiões de bens muito maiores e da manifestação de virtudes muito mais valiosas. De certo modo, poderíamos dizer que Deus aceitou a possibilidade da escuridão no mundo pois isso permitia a manifestação de uma luz muito mais pura e brilhante. Do contrário, bastaria uma simples ordem de Deus para que nem sequer um demônio pudesse ter entrado em contato com um ser humano. Assim, se Deus permitiu tal contato, é porque sabia que disso resultaria bens muito maiores.

Questão 27: O que é a morte eterna? 

Um espírito (assim como uma alma) é indestrutível, não se deteriora, não se desgasta, não se subdivide. O espírito não pode morrer. Cometa os pecados que cometer, seguirá existindo e, por mais que queira morrer, a vida não o abandonará. O que se quer dizer com as expressões 'pecado mortal', 'morte eterna' e similares, é que a vida sobrenatural de um espírito ou de uma alma não pode morrer. O pecado mortal acaba com a vida sobrenatural. O espírito continua existindo, porém com uma vida meramente natural. A vontade e a inteligência, com todas as suas potências, continuam operando, mas sem a vida da graça.

O espírito desprovido da graça é como um cadáver. Esta expressão pode parecer algo exagerada, mas é precisa. O espírito que peca mortalmente é como um cadáver inanimado, sem a graça santificante. Passa a viver então apenas para a natureza e por sua natureza, uma vez privado da graça sobrenatural. E desde o momento em que a graça tenha deixado de vivificar um espírito, ocorre com ele o mesmo que com um corpo que não está mais animado por uma alma, ou seja, começa a sua deterioração.

Assim como um corpo começa a se decompor, assim um espírito começa a se corromper à medida que sua vontade vai cedendo. São muitos os homens que vivem apenas para a natureza do seu ser, esquecendo completamente a vida sobrenatural que Deus lhes concederia com prazer. O nível de deterioração varia muito conforme a pessoa. Mas, se pudéssemos acessar a alguns destes espíritos, veríamos que se tratam de verdadeiros cadáveres que exalam um mau odor exatamente como o de um cadáver em decomposição há muito tempo.

Questão 28: Como é o processo que leva à morte eterna? 

'Cada um é tentado pela sua própria paixão, pela qual é atraído e seduzido. A paixão, depois de conceber, dá à luz ao pecado e o pecado, quando consumado, gera a morte' (Tg 1, 14 -15).  O apóstolo São Tiago, em dois versículos descreve, com uma incrível profundidade, do princípio ao fim o processo que leva à morte da alma. O pecado não se produz por si mesmo e nem por um golpe repentino que se abate subitamente diante de nós sem que tenhamos culpa; há todo um processo, tal como descrito pelo apóstolo. A tradução do grego desses dois versículos deve ser muito cuidadosa para não se perder as nuances presentes nos verbos. O processo descrito é o seguinte:


A imagem de uma mulher gestando uma criança em seu ventre durante meses é a imagem da pessoa que gesta a iniquidade em seu interior. Certamente o pecado se manifesta em um determinado momento; um segundo antes não havia pecado e, um segundo depois, sim. Uma vez ocorrido o pecado, dá-se à luz ao pecado, porque antes terá havido uma gestação dele. E tal como no mundo animal, quanto maior for a gestação, maior será o rebento que se dá à luz. Assim também no mundo espiritual, quanto maior o pecado, maior o período necessário de sua gestação para que se manifeste. Aqui está a resposta à pergunta que tantos se fazem de como é possível que tal pessoa possa ter sido capaz de cometer tal ou qual barbaridade. Nenhuma barbárie moral aparece sem um processo prévio, que ocorre oculto aos olhos dos demais, mas que vai se desenvolvendo livremente no interior de tal pessoa. 

O apóstolo usa esta expressão 'dar à luz' porque verdadeiramente o pecado experimentara antes da 'gestação' uma 'concepção'. A sedução e a vontade atuam como  o espermatozoide e o óvulo. A paixão trata de abrir caminho e penetrar na vontade. Se esta se contrapõe, a sedução prostra-se estéril sem produzir nada. Uma vez cerrada a vontade, nem milhares ou milhões de espermatozoides lograrão penetrar no íntimo da vontade. Mas, se a vontade acolher a sedução, ocorre a concepção do pecado. Ainda assim, o pecado pode ser ainda eliminado. Não sendo eliminado, põe-se a reproduzir.


O pecado dá origem a novos pecados, se reproduz, aumentando em quantidade e transmutando-se qualitativamente em faltas piores. Se o primeiro pecado incorpora um processo prévio, o pecado gestado que permanece inicia também um novo processo, processo que leva à morte: a morte da alma. E a morte da alma resulta na morte eterna. A alma invadida pelo pecado é como uma alma morta, pois não possui nenhuma vida sobrenatural dentro de si. E se a alma morta decide permanecer neste estado de corrupção até o fim, isso implica a morte eterna e a condenação.


Conhecer tudo isso nos leva a dar mais valor à ação sobrenatural da graça divina que, em qualquer momento deste processo (desde que não tenha conduzido à morte eterna), pode vivificar a alma. O perdão de Deus não é somente perdão, mas vivificação. E se isso vale para o pecado e para as paixões, vale também, só que ao contrário, para a graça e para as virtudes. A vida em Cristo é um processo, uma vida que está sempre em gestação.

(Excertos da obra 'Summa Daemoniaca', do Pe. Jose Antonio Fortea, tradução do autor do blog)

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

OS SOFRIMENTOS DO PURGATÓRIO (VI - Final)


6º sofrimento — Incerteza do Tempo a Sofrer no Purgatório

'Um homem', dizia o padre Felix, 'gemia, há tempos, numa prisão célebre. Certo dia, cansado de sofrer, concebeu a ideia de livrar-se. Nessa época existia uma senhora de elevada posses, que tinha poder bastante para quebrar as algemas do preso e pôr termo aos seus sofrimentos. Eis aqui, reza a história, em que termos eloquentes o mísero lhe dirigiu sua sú­plica: 'Senhora, a 25 do corrente de 1760, faz cem mil horas que eu peno, e ainda me restam duzentas mil a sofrer...'. Não sei que despacho teve esta petição. O coração desta mulher teve a dureza de resistir a esta eloquência? Não sei, mas parece-me impossível dizer mais em tão poucas palavras! Há cem mil horas que sofro, tenho ainda que sofrer duzentas mil!

Há cem mil horas... Portanto, ele as tinha contado! Sim, como vós podeis contar, uma a uma, as pancadas de um relógio durante uma noite longa e triste em que o sofrimento vos faz perder o sono. Ora, se é assim com os presos da terra, que dizer desses encarcerados do mundo invisível (o Purgatório)? Quem nos dirá o que é para esses padecentes de além mundo a passagem de seu prazo de tormento? A duração para nós não é o tempo que passa, é o que sentimos passar; e a lentidão dessa passagem cresce para os que sofrem, na proporção de sua an­gústia. É isto o que, em relação às almas do Purgatório, dá a extensão de longos dias aos minutos, a de anos inteiros aos dias, e aos anos a de séculos que parece nunca se acabarem!

Um religioso, aparecendo depois de morto, a um de seus Irmãos, lhe revelou que três dias passados no Purgatório lhe haviam parecido mais longos do que cente­nas de anos. Outro, havendo experimentado numa visão o suplício do Purgatório, desde as matinas somente até a aurora, persuadiu-se de que sofria há mais de um século. Um homem, que fazia desprezo das penas do Purgatório, viu aparecerem-lhe dois moços que rapidamente o transpor­taram a esse triste lugar; depois de um quarto de hora de sofrimento, ele já cla­mava: 'Retirai-me, retirai-me, há tanto tempo que eu sofro'.

Assim os encarce­rados do Purgatório, muito mais do que os presos da terra, contam essas horas intermináveis que tanto custam a passar e que o suplício parece tornar eternas! Se, ao menos, soubessem essas almas a hora do resgate, poderiam dizer: depois de tantos mil e mil minutos, meu suplí­cio terminará e eu subirei ao Céu! Mas não. Sabem perfeitamente — e é tal a es­perança e o amor de Deus, vivo e ar­dente em seus corações, que, dizem os teólogos, distinguem o Purgatório do Inferno — sabem com certeza que há de soar a hora do seu livramento; mas quando soará essa hora suspirada?

Ignoram-no, e até o momento marcado por Deus, parece-lhes ouvir cada vez que perguntam: 'Quando será?' uma voz terrí­vel que lhes respondem: 'Ainda não! Ainda há muito que expiar!' Este pensamento deve atuar em nós para continuarmos sempre em nossas ora­ções pelos mortos. 'Eu temo', diz São Fran­cisco de Sales, 'temo o bom conceito que meus amigos têm feito de mim; enten­dendo que eu já estou no Céu, sem querer me deixarão ficar no Purgatório'.

(Excertos da obra 'Mês das Almas do Purgatório', do Monsenhor José Basílio Pereira, 1943)


Oração pelas Almas do Purgatório

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Senhor, preparai e fortalecei nossos corações com a abundância de vossa graça, a fim de que, penetrando, em espírito de fé, caridade e compaixão, nas tristes prisões do Purgatório, possamos levar aos fieis que nele sofrem os tesouros de su­frágios que dão alívio aos seus padecimentos, glória à vossa divina Majestade, con­solação e paz às nossas almas.

V. Vinde, Senhor, em meu auxílio.
R. Deus, acudi em meu socorro.
V. Dai às almas o repouso, Senhor.
R. E da luz eterna o esplendor.
V. Descansem em paz.
R. Amém.

Ó Jesus, abandonado de todos e até de vossos apóstolos no Jardim de Getsêmani, dignai-vos lançar os olhos de misericórdia sobre as almas do Purgatório, em particular sobre as que não recebem orações nem consolações e que, pelo decurso do tempo ou efeito de irreligiosidade e negligência, estão esquecidas; fazei que participem das orações, santos sacrifícios, boas obras, cujo mérito não pôde ser aplicado àqueles por quem a Igreja os oferta. Ah! Senhor, não terei eu abandonado, em um criminoso esquecimento, almas que tenham jus ao meu reconhecimento, sejam de parentes, de amigos ou de benfeitores? 

Quero de ora em diante reparar tão grande ingratidão. Se conhecesse algum meio eficaz, por mais penoso que me fosse, empregá-lo-ia para aliviar essas pobres almas sem proteção no meio de um oceano de sofrimentos. Entretanto, eu me proponho fazer todos os sacrifícios que puder, e todo bem que fizer ofereço-vos à vossa glória pelas almas do Purgatório. Em consideração de nossa fé e esperança em vós, em consideração, principalmente, da agonia mortal e cruel abandono que sofrestes: dignai-vos, ó Jesus, remir-lhes as penas que ainda têm de sofrer, a fim de que pos­sam ter livre entrada no reino eterno a que aspiram e onde celebrarão a grandeza ine­fável de um Deus que não desampara ninguém. Amém.

'CONSERVEM NO CORAÇÃO O TESOURO DA VIRTUDE...'

A primeira artimanha do demônio consiste em persuadi-los de que o serviço de Deus exige uma vida triste, sem nenhum divertimento ou prazer. Mas isto não é verdade, meus caros jovens. Eu vou lhes indicar um plano de vida cristã que poderá mantê-los alegres e contentes, fazendo-os conhecer quais são os verdadeiros divertimentos e prazeres para que vocês possam exclamar como o santo profeta Davi: 'Sirvamos ao Senhor na santa alegria'.

A segunda artimanha do demônio consiste em fazê-los conceber a falsa esperança de uma longa vida que permite converter-se na velhice ou na hora da morte. Prestem atenção, meus caros jovens, muitos se deixaram prender por esta mentira. Quem nos garante que chegaremos à velhice? Mas a vida e a morte estão entre as mãos de Deus que dispõe de tudo a seu bel-prazer.

E mesmo se Deus lhes concedesse uma longa vida, escutai, entretanto, sua advertência: 'o caminho do homem começa na juventude, ele o segue na velhice até a morte'. Ou seja, se jovens começamos uma vida exemplar, seremos exemplares na idade adulta, nossa morte será santa e nos fará entrar na felicidade eterna. Se, pelo contrário, os vícios começam a nos dominar desde a juventude, é muito provável que eles nos manterão em escravidão por toda a nossa vida, até a morte. Triste prelúdio a uma eternidade terrível.

Para que esta infelicidade não lhes aconteça, eu lhes apresento um método de vida alegre e fácil, mas que lhes bastará para se tornarem a consolação de seus pais, a honra de pátria de vocês, bom cidadãos da terra, em seguida felizes habitantes do céu.

Meus caros jovens, eu os amo de todo o meu coração e basta-me que vocês sejam jovens para que eu os ame extraordinariamente. Eu lhes garanto que vocês encontrarão livros que lhes foram dirigidos pelas pessoas mais virtuosas e sábias em muitos pontos, mas, dificilmente, vocês poderão encontrar alguém que os ame mais do que eu, em Jesus Cristo, e lhes deseja mais a felicidade.

Conservem no coração o tesouro da virtude porque, possuindo-o, vocês têm tudo, mas se o perderem, tornar-se-ão os homens mais infelizes do mundo. Que o Senhor esteja sempre com vocês e que Ele lhes conceda seguir os simples conselhos presentes, para que possam aumentar a glória de Deus e obter a salvação da alma, fim supremo para o qual fomos criados. Que o Céu lhes dê longos anos de vida feliz e que o santo temor de Deus seja sempre a grande riqueza que os cumule de bens celestes aqui e por toda a eternidade. Vivam contentes e que o Senhor esteja com vocês. Seu muito afeiçoado em Jesus Cristo.
(São João Bosco)

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

OS SOFRIMENTOS DO PURGATÓRIO (V)


5º sofrimento — O esquecimento em que caem

Ver-se esquecido na terra, esquecido por aqueles a quem se amou e que nos amaram, é uma dor pungente para o coração, mas ver-se esquecido, quando, se está no Purgatório, quando o coração é mais sensível e nada de exterior o distrai dessa ideia, deve ser um golpe ainda mais cruel. Ó como são justas as queixas que um religioso ouviu desses pobres corações abandonados!

'Ó irmãos! ó irmãos! ó amigos! Pois que há tanto tempo vos aguardamos, e vós não vindes; vos chamamos, e não respondeis; sofremos tormentos que não têm iguais, e não vos compadeceis; gememos, e não nos consolais! Ai de nós! todos os que amamos na terra com toda nossa afeição, nos aban­donaram; choramos no meio desta noite escura, e não há quem nos console. Ah! tudo se acabou, acabou-se para sempre! esqueceram-me e já nem mais uma lembrança me prende à terra!

Em toda a parte está o esquecimento: sobre minha vida inteira que nenhuma palavra lembra mais, sobre meu nome que já ninguém pronuncia, sobre meu túmulo que ninguém visita, sobre minha morte que não há mais quem chore; na terra só tenho o esquecimento em todos e em tudo! A despeito dos adeuses tão sentidos, a despeito dos protestos tão afetuosos, a despeito dos juramentos tão ardentes, eis em que dá tudo entre os vivos, no total esquecimento dos mortos. Ninguém para rezar, ninguém sequer para lembrar-se deles!'

Ninguém?! Ó vós vos enganais, al­mas queridas! Há na terra um coração que nunca esquece, um coração a toda hora disposto a vir em socorro dos mor­tos esquecidos: é o coração da Igreja Ca­tólica, coração de uma mãe! Ela pede para vós, todos os dias, o repouso, o refrigério, a luz. E nós, seus filhos, como vós: nós, vossos irmãos que tanto vos temos esquecido, queremos des­de já associar-nos a todas as suas ora­ções e a todas as suas obras!

(Excertos da obra 'Mês das Almas do Purgatório', do Monsenhor José Basílio Pereira, 1943)

Oração pelas Almas do Purgatório

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Senhor, preparai e fortalecei nossos corações com a abundância de vossa graça, a fim de que, penetrando, em espírito de fé, caridade e compaixão, nas tristes prisões do Purgatório, possamos levar aos fieis que nele sofrem os tesouros de su­frágios que dão alívio aos seus padecimentos, glória à vossa divina Majestade, con­solação e paz às nossas almas.

V. Vinde, Senhor, em meu auxílio.
R. Deus, acudi em meu socorro.
V. Dai às almas o repouso, Senhor.
R. E da luz eterna o esplendor.
V. Descansem em paz.
R. Amém.

Ó Jesus, abandonado de todos e até de vossos apóstolos no Jardim de Getsêmani, dignai-vos lançar os olhos de misericórdia sobre as almas do Purgatório, em particular sobre as que não recebem orações nem consolações e que, pelo decurso do tempo ou efeito de irreligiosidade e negligência, estão esquecidas; fazei que participem das orações, santos sacrifícios, boas obras, cujo mérito não pôde ser aplicado àqueles por quem a Igreja os oferta. Ah! Senhor, não terei eu abandonado, em um criminoso esquecimento, almas que tenham jus ao meu reconhecimento, sejam de parentes, de amigos ou de benfeitores? 

Quero de ora em diante reparar tão grande ingratidão. Se conhecesse algum meio eficaz, por mais penoso que me fosse, empregá-lo-ia para aliviar essas pobres almas sem proteção no meio de um oceano de sofrimentos. Entretanto, eu me proponho fazer todos os sacrifícios que puder, e todo bem que fizer ofereço-vos à vossa glória pelas almas do Purgatório. Em consideração de nossa fé e esperança em vós, em consideração, principalmente, da agonia mortal e cruel abandono que sofrestes: dignai-vos, ó Jesus, remir-lhes as penas que ainda têm de sofrer, a fim de que pos­sam ter livre entrada no reino eterno a que aspiram e onde celebrarão a grandeza ine­fável de um Deus que não desampara ninguém. Amém.

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

OS SOFRIMENTOS DO PURGATÓRIO (IV)


4º sofrimento — O Conhecimento dos seus Pecados

As almas no Purgatório veem as coisas de Deus diversamente de nós. Esclarecidas pela divina luz, compreendem elas o respeito, o amor, a obediência que Deus lhes merecia, e toda a felicidade, ingratidão e covardia dos pecados que cometeram. E essa fealdade e laxidão, sempre ante seus olhos, enchem-nas de tanta vergonha, que procuram, embora inutilmente, fugir das vistas de suas companheiras de tor­mento.

Essa ingratidão, sempre patente, opri­me-as de tantos remorsos, que seu coração se confrange a cada instante e sente a necessidade de sofrer para expiar tanta falta de amor. Podem comparar-se, diz um piedoso bispo, com um homem que, no meio de um calor insuportável, é envolto, comprimido, esmagado por um manto, cujo peso o ani­quila e que está como soldado a todos os seus membros.

E sob esse manto estão encerrados, como em sua morada natural, vermes que se nutrem da carne desse homem e o atormentam, mordendo-o, sem que possa expeli-los. E esse manto está roto, sujo, repugnan­te, e o infeliz é obrigado a estar com ele em presença do Ser mais santo e mais puro, que o vê e, vendo-o assim, há de experimentar um sentimento de repulsão. Que estado esse, que dor, que vergonha!

É o estado permanente, o sofrimento contínuo, a vergonha das almas do Pur­gatório à recordação de suas faltas e em presença dos anjos e do próprio Deus. A esta vergonha vem se unir o pensa­mento de que teriam podido facilmente evitar as faltas que as fazem sofrer!

Ah! dizem elas, se eu tivesse obedecido ao meu Deus naquela ocasião em que me custava tão pouco; se eu não lhe hou­vesse recusado um sacrifício que era bem leve! Se eu não proferisse aquela pala­vra que minha consciência reprovava; se eu não me tivesse descuidado de ganhar aquela indulgência tão fácil, não me veria como me vejo neste momento! Não sofreria o que sofro! Tardio arrependimento! As lágrimas não purificam mais, quando se tem deixado passar o tempo da misericórdia! Ó almas queridas, possam ao menos as vossas dores servir-nos de lição!

(Excertos da obra 'Mês das Almas do Purgatório', do Monsenhor José Basílio Pereira, 1943)


Oração pelas Almas do Purgatório

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Senhor, preparai e fortalecei nossos corações com a abundância de vossa graça, a fim de que, penetrando, em espírito de fé, caridade e compaixão, nas tristes prisões do Purgatório, possamos levar aos fieis que nele sofrem os tesouros de su­frágios que dão alívio aos seus padecimentos, glória à vossa divina Majestade, con­solação e paz às nossas almas.

V. Vinde, Senhor, em meu auxílio.
R. Deus, acudi em meu socorro.
V. Dai às almas o repouso, Senhor.
R. E da luz eterna o esplendor.
V. Descansem em paz.
R. Amém.

Ó Jesus, abandonado de todos e até de vossos apóstolos no Jardim de Getsêmani, dignai-vos lançar os olhos de misericórdia sobre as almas do Purgatório, em particular sobre as que não recebem orações nem consolações e que, pelo decurso do tempo ou efeito de irreligiosidade e negligência, estão esquecidas; fazei que participem das orações, santos sacrifícios, boas obras, cujo mérito não pôde ser aplicado àqueles por quem a Igreja os oferta. Ah! Senhor, não terei eu abandonado, em um criminoso esquecimento, almas que tenham jus ao meu reconhecimento, sejam de parentes, de amigos ou de benfeitores? 

Quero de ora em diante reparar tão grande ingratidão. Se conhecesse algum meio eficaz, por mais penoso que me fosse, empregá-lo-ia para aliviar essas pobres almas sem proteção no meio de um oceano de sofrimentos. Entretanto, eu me proponho fazer todos os sacrifícios que puder, e todo bem que fizer ofereço-vos à vossa glória pelas almas do Purgatório. Em consideração de nossa fé e esperança em vós, em consideração, principalmente, da agonia mortal e cruel abandono que sofrestes: dignai-vos, ó Jesus, remir-lhes as penas que ainda têm de sofrer, a fim de que pos­sam ter livre entrada no reino eterno a que aspiram e onde celebrarão a grandeza ine­fável de um Deus que não desampara ninguém. Amém.

terça-feira, 22 de novembro de 2016

22 DE NOVEMBRO - SANTA CECÍLIA


Cecília, virgem e mártir romana do século III sob o império de Marco Aurélio, foi a primeira santa da Igreja exumada com corpo incorrupto, muitos séculos após a sua morte, fato que a tornou de imediato uma das santas mais veneradas da Idade Média e que levou o seu nome a figurar no próprio Cânon da Missa.

Os poucos dados disponíveis de sua vida foram relatados na obra 'Paixão de Santa Cecília', do século V. Sabe-se que, desde muito cedo, Cecília perdeu os pais e ofereceu-se a Deus como Esposa de Cristo. Contra as suas pretensões, foi prometida pelos seus parentes em casamento a Valeriano, um jovem nobre romano. Como esposa de Valeriano, conseguiu a conversão do marido e a sua aceitação a uma vida conjugal como irmãos. Mais tarde, Tibúrcio, irmão de Valeriano, também abraçou plenamente a fé cristã.

Em função da perseguição romana aos que professavam a fé cristã e, uma vez denunciados, Valeriano e Tibúrcio foram decapitados. Quanto a Cecília, foi condenada inicialmente à morte por asfixia em uma câmara úmida sob elevadas temperaturas. Ilesa diante dessa condenação, Cecília foi levada a um templo para ser decapitada e, mesmo mortalmente ferida, agonizou ainda por muito tempo. Seu corpo foi sepultado, na mesma posição de sua morte, nas catacumbas romanas.

Em 1599, o túmulo de Santa Cecília foi encontrado e, uma vez aberto, revelou o corpo intacto da santa em uma posição de suave repouso, imagem que foi reproduzida e ratificada em uma célebre escultura de puro mármore feita pelo artista Stefano Maderno (1566-1636). É considerada a padroeira da música sacra e dos músicos, sendo comumente representada com um instrumento musical porque, durante os festejos do seu casamento, durante músicas e canções festivas, teria elevado o pensamento a Deus em piedosa aspiração: 'Senhor, guardai sem mancha meu corpo e minha alma, para que eu não seja confundida'. 

(decapitação de Santa Cecília)

(estátua em mármore de Santa Cecília)


Santa Cecília, rogai por nós!

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

VÍDEOS CATÓLICOS

Non nobis Domine, non nobis, sed nomini tuo da gloriam

'Não a nós, ó Senhor, não a nós, mas ao teu nome dai a glória'

Versículo retirado do Livro dos Salmos (Salmo 113,9), como pleito de agradecimento e humildade em reconhecer, na expressão do que fazemos, uma ação voltada exclusivamente à maior glória de Deus. Constituiu por séculos o lema dos cavaleiros templários. De acordo com a tradição, o rei Henrique V ordenou que fosse cantado, juntamente com o Te Deum, em ação de graças em louvor a Deus pela vitória inglesa na batalha de Agincourt, parte da Guerra dos Cem Anos (1337-1453) travada entre ingleses e franceses. 

Mesmo com um exército muito menor e avançando em território inimigo, mas aproveitando muito bem estrategicamente o terreno enlameado (pois chovera na véspera) e a floresta em torno do campo de batalha, o exército inglês massacrou os franceses nesta batalha, ocorrida em 15 de outubro de 1415. No vídeo abaixo, do filme inglês Henry V, a cena do hino sendo cantado é retratada, enquanto a câmera acompanha o rei carregando nos ombros um jovem morto ao longo do cenário sangrento e enlameado do campo de batalha.

Non nobis Domine, Domine, non nobis, sed nomini,
sed nomini tuo da gloriam