sexta-feira, 7 de outubro de 2016

PORQUE HOJE É A PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS


A Grande Revelação do Sagrado Coração de Jesus foi feita a Santa Margarida Maria Alacoque durante a oitava da festa de Corpus Christi  de 1675...

         “Eis o Coração que tanto amou os homens, que nada poupou, até se esgotar e se consumir para lhes testemunhar seu amor. Como reconhecimento, não recebo da maior parte deles senão ingratidões, pelas suas irreverências, sacrilégios, e pela tibieza e desprezo que têm para comigo na Eucaristia. Entretanto, o que Me é mais sensível é que há corações consagrados que agem assim. Por isto te peço que a primeira sexta-feira após a oitava do Santíssimo Sacramento seja dedicada a uma festa particular para  honrar Meu Coração, comungando neste dia, e O reparando pelos insultos que recebeu durante o tempo em que foi exposto sobre os altares ... Prometo-te que Meu Coração se dilatará para derramar os influxos de Seu amor divino sobre aqueles que Lhe prestarem esta honra”.


... e as doze Promessas:
  1. A minha bênção permanecerá sobre as casas em que se achar exposta e venerada a imagem de meu Sagrado Coração.
  2. Eu darei aos devotos do meu Coração todas as graças necessárias a seu estado.
  3. Estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias.
  4. Eu os consolarei em todas as suas aflições.
  5. Serei seu refúgio seguro na vida, e principalmente na hora da morte.
  6. Lançarei bênçãos abundantes sobre todos os seus trabalhos e empreendimentos.
  7. Os pecadores encontrarão em meu Coração fonte inesgotável de misericórdias.
  8. As almas tíbias se tornarão fervorosas pela prática dessa devoção.
  9. As almas fervorosas subirão em pouco tempo a uma alta perfeição.
  10. Darei aos sacerdotes que praticarem especialmente essa devoção o poder de tocar os corações mais empedernidos.
  11. As pessoas que propagarem esta devoção terão os seus nomes inscritos para sempre no meu Coração.
  12. A todos os que comungarem nas primeiras sextas-feiras de nove meses consecutivos, darei a graça da perseverança final e da salvação eterna.

    ATO DE DESAGRAVO AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS 
    (rezai-o sempre, particularmente nas primeiras sextas-feiras de cada mês)

Dulcíssimo Jesus, cuja infinita caridade para com os homens é deles tão ingratamente correspondida com esquecimentos, friezas e desprezos, eis-nos aqui prostrados, diante do vosso altar, para vos desagravarmos, com especiais homenagens, da insensibilidade tão insensata e das nefandas injúrias com que é de toda parte alvejado o vosso dulcíssimo Coração.

Reconhecendo, porém, com a mais profunda dor, que também nós, mais de uma vez, cometemos as mesmas indignidades, para nós, em primeiro lugar, imploramos a vossa misericórdia, prontos a expiar não só as nossas próprias culpas, senão também as daqueles que, errando longe do caminho da salvação, ou se obstinam na sua infidelidade, não vos querendo como pastor e guia, ou, conspurcando as promessas do batismo, renegam o jugo suave da vossa santa Lei.

De todos estes tão deploráveis crimes, Senhor, queremos nós hoje desagravar-vos, mas particularmente das licenças dos costumes e imodéstias do vestido, de tantos laços de corrupção armados à inocência, da violação dos dias santificados, das execrandas blasfêmias contra vós e vossos santos, dos insultos ao vosso vigário e a todo o vosso clero, do desprezo e das horrendas e sacrílegas profanações do Sacramento do divino Amor, e enfim, dos atentados e rebeldias oficiais das nações contra os direitos e o magistério da vossa Igreja.

Oh, se pudéssemos lavar com o próprio sangue tantas iniquidades! Entretanto, para reparar a honra divina ultrajada, vos oferecemos, juntamente com os merecimentos da Virgem Mãe, de todos os santos e almas piedosas, aquela infinita satisfação que vós oferecestes ao Eterno Pai sobre a cruz, e que não cessais de renovar todos os dias sobre os nossos altares.

Ajudai-nos, Senhor, com o auxílio da vossa graça, para que possamos, como é nosso firme propósito, com a viveza da fé, com a pureza dos costumes, com a fiel observância da lei e caridade evangélicas, reparar todos os pecados cometidos por nós e por nossos próximos, impedir, por todos os meios, novas injúrias à vossa divina Majestade e atrair ao vosso serviço o maior número possível de almas.

Recebei, ó Jesus de Infinito Amor, pelas mãos de Maria Santíssima Reparadora, a espontânea homenagem deste nosso desagravo, e concedei-nos a grande graça de perseverarmos constantes até a morte no fiel cumprimento dos nossos deveres e no vosso santo serviço, para que possamos chegar todos à Pátria bem-aventurada, onde vós, com o Pai e o Espírito Santo, viveis e reinais, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

CREDO DA VIDA INTERIOR

Quando empregamos as palavras vida de oração, contemplação, vida contemplativa - termos que se encontram nos Padres da Igreja e nos escolásticos - a nossa intenção é sempre designar a vida interior normal, acessível a todos, e não os estados pouco comuns de oração que a teologia mística estuda, como êxtases, visões, arrebatamentos, etc. Sairíamos do nosso plano, se nos demorássemos num estudo de ascetismo. Limitamo-nos a recordar, em poucas palavras, o que todos os católicos devem aceitar como absolutamente certo, no que diz respeito ao governo da sua alma.

Primeira Verdade:

A vida sobrenatural é a vida do próprio Jesus Cristo em mim, pela fé, pela esperança e pela caridade. A presença de Nosso Senhor, por meio desta vida sobrenatural, não é a presença real, própria da sagrada comunhão, mas uma presença de ação vital, como pode ser, no corpo humano, a ação da cabeça ou do coração sobre os membros; ação íntima, que Deus, quase sempre, me oculta, tornando-a insensível às minhas faculdades naturais, para aumentar o mérito da minha fé; ação divina que deixa subsistir o meu livre arbítrio e utiliza as causas segundas - acontecimentos, pessoas e coisas - para me fazer conhecer a vontade de Deus e aumentar a minha participação na vida divina. Esta vida, iniciada no batismo, pelo estado de graça; aperfeiçoada pela confirmação; conservada e enriquecida pela eucaristia, é a minha vida cristã.

Segunda Verdade:

Jesus Cristo comunica-me o seu Espírito por meio desta vida, e torna-se, assim, o princípio superior que me leva - caso não lhe oponha obstáculos - a pensar, julgar, amar, querer, sofrer e trabalhar com Ele. por Ele e nEle. As minhas ações exteriores tornam-se manifestações desta vida de Jesus em mim, e começo a realizar o ideal de vida interior formulado por São Paulo: 'Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim' (Gl 2, 20). A vida cristã, a piedade, a vida interior, a santidade não diferem essencialmente entre si; são os diversos graus de um só e mesmo amor; são a aurora, a luz e o esplendor do mesmo sol.

A minha vida interior há de ser, pois, a minha vida cristã aperfeiçoada. O essencial da vida cristã limita-se aos esforços necessários para conservar a graça santificante. A vida interior vai mais além. Visa o desenvolvimento desta graça, procura atrair graças atuais abundantes e corresponder a elas. Posso, assim, defini-la como o estado de atividade da alma que regula as suas inclinações naturais, e se esforça por adquirir o hábito de julgar e de se dirigir em tudo pela luz do Evangelho e os exemplos de Nosso Senhor. Portanto, dois movimentos. Em virtude do primeiro, a alma subtrai-se a tudo quanto as criaturas possam ter de contrário à vida sobrenatural, e procura estar incessantemente presente a si mesma: Aversio a creaturis. Em virtude do segundo, a alma tende para Deus e com Ele se une: Conversio ad Deum. Assim é que a alma quer ser fiel à graça que Nosso Senhor lhe oferece a cada momento. Em suma, vive unida a Jesus e realiza a sua vontade: 'O que permanece em Mim, e Eu nele, esse dá muito fruto; porque sem Mim nada podeis fazer' (Jo 15, 5).

Terceira Verdade:

Privar-me-ia de um dos mais poderosos meios de adquirir esta vida interior, se me não esforçasse por ter fé precisa e sólida nesta presença ativa de Jesus em mim, e, sobretudo, por alcançar que essa presença se torne em mim uma realidade viva, vivíssima até, que vá penetrando, cada vez mais, a atmosfera das minhas faculdades. Jesus tornar-se-á, assim, a minha luz, o meu ideal, o meu conselho, o meu apoio, o meu recurso, a minha força, o meu médico, a minha consolação, a minha alegria, o meu amor, numa palavra a minha vida. Adquirirei, deste modo, todas as virtudes. Somente então poderei dizer, com toda a sinceridade, a admirável oração de São Boaventura, que a Igreja aconselha como ação de graças depois da missa: 'Feri, dulcíssimo Jesus, o mais íntimo e profundo do meu ser com o dardo suavíssimo e salutar do vosso amor...'

Quarta Verdade:

A minha vida sobrenatural pode crescer, a cada instante, em proporção com a intensidade do meu amor a Deus, por meio de nova infusão da graça da presença ativa de Jesus em mim. Tal infusão é produzida através dos atos meritórios (virtude, trabalho, sofrimentos, oração, missa, etc.) e pelos sacramentos, sobretudo a Eucaristia. É, pois, certo - e esta consequência esmaga-me com a sua grandeza, mas também me enche de júbilo - que por meio de cada pessoa ou acontecimento, Jesus manifesta-se a mim, ocultando, sob essas aparências, a sua sabedoria e amor. É sempre Jesus que se apresenta à minha alma. por meio da graça do momento presente - missa, oração, leitura, atos de caridade, de renúncia, de luta, de confiança - solicitando sempre a minha cooperação para aumentar em mim a sua vida. Ousarei esconder-me?

Quinta Verdade:

A tríplice concupiscência, causada pelo pecado original, e aumentada por cada pecado atual, gera em mim elementos de morte opostos à vida de Jesus. Ora, essas inclinações e tentações diminuem esta vida e podem chegar a suprimi-la. Mas, se a minha vontade resistir, elas não lhe causarão qualquer prejuízo. Pelo contrário, contribuirão, como qualquer elemento de combate espiritual, para aumentá-la, conforme a medida do meu esforço.

Sexta Verdade:

Sem o emprego fiel de certos meios, a inteligência obscurece-se e a vontade torna-se fraca para cooperar com Jesus no aumento e conservação da sua vida em mim. A diminuição dessa vida produz a tibieza da vontade. A dissipação, a covardia, a ilusão, fazem-me cair nos pecados veniais. E estes põem em risco a minha salvação, porque dispõe a minha alma para o pecado mortal. Se tiver a infelicidade de cair nesta tibieza (e se cair ainda mais baixo), devo tentar tudo para dela sair, reavivando o meu temor de Deus, pondo-me em presença do meu fim, da morte, dos juízos de Deus, do inferno, da eternidade, do pecado, etc., e reacendendo o meu amor a Jesus, pela consideração das suas chagas, da sua paixão e morte na cruz. Irei em espírito ao Calvário, onde me prostrarei aos pés sacratíssimos do Redentor, a fim de que o seu sangue vivo, correndo pela minha cabeça e pelo meu coração, dissipe a cegueira e o gelo da minha alma e galvanize a minha vontade. 

Sétima Verdade:

Se a minha sede de viver de Jesus deixar de aumentar, é porque não possuo o grau de vida interior que Ele exige de mim. Tal sede há de dar-me o desejo de lhe agradar em tudo e o temor de lhe desagradar. Também é indispensável o mínimo de recolhimento, que me permita, no decurso das ocupações, conservar o coração numa pureza e generosidade suficientemente grandes para não ser abafada a voz de Jesus. Ora, essa sede diminuirá, certamente, se não puser em prática certos meios: oração da manhã, vida litúrgica, sacramentos, comunhões espirituais, exame de consciência, leitura espiritual, etc., ou se, por culpa minha, esses meios já nada me dizem. Sem vida interior e recolhimento, os pecados veniais hão de multiplicar-se na minha vida, e chegarei a não fazer caso deles. Para os ocultar e enganar-me a mim mesmo, servirão as aparências de piedade, o zelo pelas obras, etc..

Oitava Verdade:

A minha vida interior será o que for a minha guarda do coração: 'Aplica-te com todo o cuidado possível à guarda do teu coração, porque dele é que procede a vida' (Pv 4, 23). Esta guarda do coração é a solicitude em preservar todos os meus atos, de tudo o que pode viciar a sua causa motriz ou a sua prática. Solicitude tranquila, natural, mas também enérgica, pois baseia-se no recurso filial a Deus. É trabalho mais do coração e da vontade que do espírito, o qual deve ficar livre para a prática dos seus deveres. Longe de embaraçar a ação, a guarda do coração aperfeiçoa-a, regulando-a pelo espírito de Deus e acomodando-a aos deveres de estado.

Este exercício pratica-se a todo o momento. É uma observação, por meio do coração, das ações presentes e das diversas partes de cada ação, à medida em que elas se realizam. É a observância exata do age quod agis. Como sentinela vigilante, a alma observa, atentamente, os movimentos do seu coração, e vigia as suas inclinações, as paixões, as palavras e as ações. A guarda do coração exige certo recolhimento; uma alma dissipada não consegue realizá-la. Mas com a sua prática frequente, adquire-se o hábito. Para onde vou? Que faria Jesus em meu lugar? O que me aconselharia? Que exige Ele de mim neste momento? Tais são as interrogações que. espontaneamente, se apresentam à alma sedenta de vida interior. Para a alma que vai a Jesus, por meio de Maria, a guarda do coração reveste-se de um caráter ainda mais afetivo, e o recurso a esta boa Mãe torna-se verdadeira necessidade para o seu coração. 

Nona Verdade:

Quando uma alma procura imitar Jesus, em tudo e com todo o afeto, Ele reina nela. Nesta imitação há dois graus: (i) A alma esforça-se por se tornar indiferente às criaturas, consideradas em si mesmas, quer sejam conformes quer contrárias aos seus gostos. A exemplo de Jesus, apenas procura a vontade de Deus: 'Eu desci do céu, não para fazer a minha vontade, mas a dAquele que Me enviou' (Jo 6, 38). (ii) 'Jesus Cristo não procurou o que lhe era agradável' (Rm 15, 3). A alma inclina-se de melhor vontade para o que a contraria e repugna à natureza. Realiza então o agere contra (agir contra) de que fala Santo Inácio na sua célebre meditação do Reino de Cristo. É a ação contra a natureza, a fim de se preferir o que imita a pobreza do Salvador e o seu amor pelos sofrimentos e pelas humilhações. Segundo a expressão de São Paulo, é, então, que a alma conhece, verdadeiramente, a Cristo (Ef 4, 20).

Décima Verdade:

Seja qual for o meu estado, Jesus oferece-me, caso queira rezar e corresponder à sua graça, todos os meios de regressar à vida interior. Então, a minha alma não cessará de possuir a alegria, mesmo até no seio das provações, e nela se realizarão as palavras de Isaías: 'Então a tua luz surgirá como a aurora, e as tuas feridas não tardarão a cicatrizar-se; a tua justiça irá adiante de ti, e a glória do Senhor atrás de ti. Então invocarás o Senhor e Ele te atenderá; clamarás e Ele dirá: Eis-me aqui! (...) O Senhor te guiará constantemente, saciará a tua alma no árido deserto, dará vigor aos teus ossos e serás como um jardim bem regado, como uma fonte de águas inesgotáveis' (Is 58, 8-9-11).

Décima Primeira Verdade:

Deus quer que eu me santifique e me dedique às obras de apostolado. Devo, pois, gravar na minha alma esta convicção: Jesus quer ser a vida dessas obras. Os meus esforços, por si só, nada são: 'Sem Mim, nada podeis fazer' (Jo 15, 5). Somente serão úteis e abençoados por Deus, quando, por meio da verdadeira vida interior, estiverem unidos à ação vivificadora de Jesus. Tornar-se-ão, assim, onipotentes: 'Tudo posso nAquele que me conforta' (Fl 4, 13). Se proviessem da confiança orgulhosa nos meus talentos, seriam rejeitados por Deus. Porventura não seria sacrílega loucura da minha parte querer arrebatar a Deus, para com ela me adornar, uma porção da sua glória?

Longe de gerar em mim a pusilanimidade, tal convicção será a minha força. Sentirei a necessidade da oração para obter a humildade, que é um tesouro para a minha alma, a certeza do auxílio de Deus e o penhor do êxito para as minhas obras! Compenetrado da importância deste princípio, farei, durante os meus retiros, um sério exame de consciência para saber: se estou convicto da nulidade da minha ação, e da sua força, quando unida à ação de Jesus; se excluo, implacavelmente, qualquer vaidade, qualquer auto-contemplação, na minha vida de apóstolo; se me mantenho numa desconfiança absoluta de mim mesmo; e se peço a Deus que dê vida às minhas obras e me preserve do orgulho, primeiro e principal obstáculo para receber o seu auxílio.

Este credo da vida interior, tornado a base da existência para a alma, assegura-lhe, já neste mundo, uma participação da felicidade celeste.Vida interior, vida dos predestinados.Corresponde ao fim que Deus se propôs ao criar-nos. Corresponde ao fim da Encarnação: 'Deus enviou o seu Filho unigênito ao mundo, para que nós vivamos por Ele' (l Jo 4, 9). 'O fim da criatura humana' - diz São Tomás - 'é unir-se a Deus: toda a sua felicidade consiste nisso'. Ao contrário das alegrias do mundo, se nessa vida há espinhos exteriores, dentro há rosas. 'Devemos lamentar os pobres mundanos' - dizia o santo cura dArs - 'pesa-lhes sobre os ombros um manto forrado de espinhos; não podem fazer um movimento sem se picarem; ao passo que os verdadeiros cristãos têm um manto forrado de arminho'. 'Veem a cruz, mas não veem a unção', dizia São Bernardo. Estado celeste! A alma torna-se um céu vivo. Como Santa Margarida Maria, ela canta: 'Possuo constantemente, acompanhando os passos meus, o Deus do meu coração, e o coração do meu Deus'. É o começo da bem-aventurança. A graça é o céu na terra.

(Excertos da obra 'A Alma de Todo Apostolado', de Dom J.B. Chautard) 

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

QUESTÕES SOBRE A NATUREZA DO DEMÔNIO (IV)


Questão 8: Existe o tempo para os demônios? 


Sim, existe [também] o tempo para os demônios. Não é um tempo como o nosso (um tempo material), mas se trata de um tempo próprio dos espíritos, tempo que é chamado de 'evo' (ævum em latim). O evo é a sucessão dos atos de entendimento e de vontade em um ser espiritual. Os atos da razão e da vontade se sucedem, provocando um antes e um depois; um antes de um determinado ato de entendimento ou de ato de querer algo. Desde que se tem um antes e um depois, existe algum tipo de tempo.

Portanto, quando se diz que os espíritos no céu ou no inferno estão na eternidade, há que se entender com esta afirmação que eles estão em uma interminável sucessão temporal, uma sucessão de tempo sem fim, com princípio (quando foram criados), porém sem fim. Somente Deus está em um eterno presente, somente nEle não há sucessão de tempo de espécie alguma. NEle não há transcorrido nunca nem um segundo sequer, nem antes e nem depois. A eternidade de Deus é qualitativamente distinta da eternidade do tempo material (com um princípio e sem fim) e da eternidade do evo (também com um princípio e sem fim).

Sobre este modo de tempo - o evo - São Tomás de Aquino já falava no século XIII na Primeira Parte da Questão X, artigo V de sua Summa Theologica e certamente a alguns pôde parecer que o seu raciocínio era excessivamente teórico. Porém, ao escutar relatos de pessoas que passaram por experiências de quase-morte, pessoas que viveram a experiência de uma separação do corpo, de penetrarem em um 'túnel', etc, constata-se que, ao lhes ser perguntado se havia tempo nessa experiência, ou seja, se perceberam a passagem do tempo, as respostas dadas concordam plenamente com o que São Tomás de Aquino explica sobre o evo ao falar dos espíritos imateriais.

Questão 9: No que pensa um demônio? 

Todo anjo decaído conserva a inteligência de sua natureza angélica e, com ela, segue conhecendo. Conhece e indaga com a sua mente o mundo material e espiritual, o mundo real e o intelectual. Como um ser espiritual, eminentemente intelectual, não há dúvidas de que está profundamente interessado nas questões de ordem conceitual. Ele sabe muito bem que a filosofia é a mais elevada das ciências e, inclusive, que a teologia está acima da filosofia; porém, odeia a Deus. No conhecimento, encontra prazer, mas também sofrimento. Sofre a cada vez que esse conhecimento o leva a considerar a Deus. E o demônio percebe continuamente a ordem e a glória do Criador em todas as coisas. Até mesmo nas coisas aparentemente mais neutras, ele se defronta com o reflexo e a confirmação dos atributos divinos. 

Mas o demônio não está sempre sofrendo, em cada instante. Muitas, vezes, está simplesmente pensando. Ele sofre em certos momentos, quando se recorda de Deus, quando volta a se dar conta do seu estado miserável, de sua separação de Deus, no remorso de sua consciência. Certas vezes sofre mais, outras vezes menos, mas seu sofrimento não é uniforme e estas variações ocorrem segundo a intensidade que assinala a deformidade moral de cada demônio. Seria terrível imaginar os demônios como seres permanentemente em sofrimento, em cada instante e cada momento. A separação de Deus produz sofrimento por toda a eternidade, mas é um sofrimento de afastamento e não um sofrimento de um instrumento de tortura, em ação contínua. O demônio não está sempre nos tentando, nem está sempre retorcendo-se sob dores espirituais [tremendas].

Questão 10: Qual é a linguagem utilizada pelos demônios? 

A linguagem utilizada pelos demônios é exatamente a mesma que a usada pelos anjos. Os anjos não necessitam de nenhuma língua ou idioma para comunicar-se entre si, pois se comunicam com espécies inteligíveis. As espécies inteligíveis são os pensamentos que se transmitem entre eles. Nós manifestamos palavras e eles se comunicam, diretamente por pensamentos em estado puro, sem necessidade de intervenções sensíveis ou sinais. As espécies inteligíveis podem ser comunicações por raciocínios, imagens, sentimentos, etc. A transmissão destas espécies inteligíveis se faz por telepatia, por atos de vontade, e pode suscitar diálogos como no caso dos seres humanos. As inteligências humanas comunicam os seus raciocínios por meio de palavras, que são sinais [sensíveis]. Os espíritos angélicos comunicam-se entre si por meio de pensamentos em estado puro. 

Questão 11: Onde estão os demônios? 

Tanto as almas dos condenados como as dos demônios não podem deslocar-se nas coordenadas do espaço. Também não se pode dizer que estão em outra dimensão. O que significa estar ou não estar em outra dimensão para um espírito? Simplesmente que não estão em lugar algum. Existem, mas não estão nem aqui nem acolá. Diz-se que um demônio está em um local quando atua nesse local. Se um demônio está tentando alguém aqui, diz-se que ele está aqui. Se um demônio toma posse de um corpo acolá, diz-se que ele está acolá. Se um demônio move um móvel num lugar num fenômeno tipo poltergeist, diz-se que ele está neste lugar. Mas, na realidade, ele não está ali, mas apenas atuando ali. O inferno, o céu e o purgatório são estados. 

[Apenas] depois da ressurreição dos corpos dos condenados, aí estarão em um local determinado e, assim, o inferno será um lugar. Os corpos dos bem-aventurados também ocuparão um lugar. Por isso, lê-se na Bíblia: 'e vi um novo céu e uma nova terra' (Ap 21, 1). Daí depreende-se que os bem-aventurados habitarão a terra restaurada novamente após a destruição narrada no Apocalipse. Sabendo que os bem-aventurados habitarão, em corpo, nesta terra, onde estarão os homens condenados? Nada se pode afirmar com segurança [sobre isso]. Alguns pensam que o lugar deles encontra-se no centro deste mesmo mundo [núcleo da terra]. 

(Excertos da obra 'Summa Daemoniaca', do Pe. Jose Antonio Fortea, tradução do autor do blog)

terça-feira, 4 de outubro de 2016

O CRISTO DO SUDÁRIO

Reconstituição rigorosa do Crucificado, obra do escultor espanhol Juan Manuel Miñarro, com base nas evidências mais detalhadas e realistas possíveis expostas no Santo Sudário. Um homem com 1,80m de altura, crucificado com os braços abertos em um ângulo de 65°, com as marcas e as feridas contundentes e generalizadas de uma brutal flagelação a que foi submetido antes da morte na cruz. Detalhes como o ventre proeminente, a coroa de espinhos, o polegar recurvado sobre a palma da mão, a posição dos cravos e a inscrição escrita da esquerda para a direita refletem os aspectos singulares que constituem esta obra única e excepcional.









(Fotografias de J.L. Risoto Rojas)

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

DA EXPLICAÇÃO DO MAGNIFICAT (IV)


Bendita me chamarão todas as gerações

Essa grande profecia, declarando-nos que todas as gerações devem reconhecer e proclamar Bem-aventurada a Mãe do Salvador, compreende todo o universo, desde o mais alto dos céus até o mais profundo dos infernos, pois:

1. Além de lhe ter a Santíssima Trindade enviado um dos primeiros príncipes de seu império para anunciar-lhe que é cheia de graça, que o Senhor é com ela para nela operar as maiores maravilhas que jamais existiram e jamais existirão, e que é bendita entre todas as mulheres e acima de todas as criaturas: a mesma Trindade a exalta acima de todos os anjos, no dia de sua assunção e a estabelece no mais alto trono de glória.

2. O Pai eterno a honra como a mais feliz de todas as mulheres, dando-lhe um poder que ultrapassa todos os poderes da terra e do céu; o Filho de Deus a proclama bem-aventurada entre todas as nações às quais manda pregar o seu santo Evangelho; o Espírito Santo a torna felicíssima e gloriosíssima, comunicando-lhe sua santidade em tão alto grau que ela é a rainha de todos os anjos e de todos os santos.

3. Todas as hierarquias de anjos a reconhecem bem-aventurada, pois, contemplando-a no dia de seu triunfo e de sua gloriosa assunção, acham-na tão cheia de maravilhas, que falam com admiração e como que todos arrebatados e transportados. Quem é esta? dizem eles, Quem é esta? Quem é esta? E, após as adorações que rendem continuamente a Deus no céu, a primeira de suas ocupações é a de fazer ressoarem incessantemente os louvores de sua soberana imperatriz.

4. Não é verdade também que todas as almas que se achavam nos limbos, desde o início do mundo até a morte do Filho de Deus, foram libertadas por intermédio dessa Virgem incomparável, se foi ela quem lhes deu um Redentor para livrá-las de seu cativeiro?

É assim que todas as gerações do céu, dos anjos, dos santos, da Igreja triunfante, da Igreja militante e da Igreja padecente cumprem a profecia da gloriosa Virgem: Bendita me chamarão todas as gerações  - Beatam me dicent omnes generationes.

(Da Explicação do Magnificat, de São João Eudes)

domingo, 2 de outubro de 2016

'AUMENTA A NOSSA FÉ!'

Páginas do Evangelho - Vigésimo Sétimo Domingo do Tempo Comum 


'Aumenta a nossa fé!' (Lc 15,5). Eis o pedido dos apóstolos ao Senhor, naquele dia. Eis a nossa súplica ao Senhor através dos tempos: eu creio firmemente, Senhor, mas aumenta a minha fé! O crescimento da fé implica a fé professada, vivida no cotidiano de nossas vidas, alimentada por atos de piedade e devoção cristãs. O incremento da fé implica a fé testemunhada pela conduta de cristãos no mundo, na doação às necessidades do próximo, na prática de uma caridade submersa por completo na gratuidade do amor de Deus.

E a resposta de Jesus é incisiva: 'Se vós tivésseis fé, mesmo pequena como um grão de mostarda...' (Lc 15,6), tornar-se-ia possível arrancar uma planta de raízes profundas e vigorosas e arremessá-la ao mar, seria possível mover as montanhas de lugar e fazer portentos ainda maiores. Pois a fé mobiliza forças inauditas e incompreensíveis aos valores humanos, mas possíveis para a Santa Vontade de Deus, que não conhece abismos ou limites.

E Jesus, com a parábola do senhor e do seu empregado, resume o que deve ser a prática do exercício cristão da fé, como dever e obrigação, não como apropriação de mérito ou regalia de gratidão. A fé plena nos exige a caridade despojada, a entrega cotidiana às graças de Deus nas nossas pequenas ações de cada dia. Sejamos 'servos inúteis' (Lc 15, 10) na consumação completa do nosso eu em nossas ações para e tão somente à glória de Deus. 

A fé é 'o precioso depósito que, com a ajuda do Espírito Santo, habita em nós' (2 Tm1, 14). Na confiança irrestrita à vontade do Pai e na completa dependência aos Seus desígnios, achemos consolação apenas em viver para servir e servir sem reservas, como oferta ao Senhor da vida e submissos à Santa Vontade de Deus, pois o homem justo não morrerá jamais e 'viverá por sua fé' (Hab 1, 4).

sábado, 1 de outubro de 2016

01 DE OUTUBRO - SANTA TERESA DE LISIEUX


Chamada de ‘maior santa dos tempos modernos’ e recentemente elevada à glória de doutora da Igreja Católica, Teresa de Lisieux transformou-se num dos personagens mais venerados no mundo católico como ‘Santa Teresinha do Menino Jesus’. Feitos extraordinários para uma simples carmelita, que viveu no mais absoluto ostracismo e morreu com apenas 24 anos de idade. Marie Françoise Thérèse Martin nasceu em Alençon, em 02/01/1873, e faleceu em Lisieux, em 30/09/1897. Foi canonizada em 17 de maio de 1925 pelo Papa Pio XI, que posteriormente a declarou ‘Patrona Universal das Missões Católicas’ em 1927. O Papa João Paulo II tornou-a Doutora da Igreja no dia 19 de outubro de 1997. 

Por desígnios divinos, Santa Teresinha foi a preceptora de um particular caminho de santificação: a chamada ‘pequena via’, a via de confiança absoluta à vontade de Deus. Na plena aceitação dos desígnios divinos sobre as almas de cada um de nós, no abandono de nossas vidas nos braços de Jesus Cristo, na entrega total de nossas ações e pensamentos à proteção da Santíssima Virgem: eis aí a pequena via, o caminho da infância espiritual, a gloriosa trilha de santificação para os homens comuns, o espantoso atalho ao Céu, proposto e vivido intensamente pela santa carmelita. Eis a sua pequena via maravilhosa de santificação: basta aceitar a nossa própria pequenez, a imensa fragilidade humana que nos domina, as enormes limitações de viver em plenitude os desígnios de Deus sobre as nossas almas; fazer de tantas imperfeições e fragilidades, não meros obstáculos, mas as próprias pedras do caminho, rejuntadas e consolidadas firmemente num imenso amor e numa confiança sem limites na bondade e misericórdia de Deus. 

Além de cartas e poesias (e outros documentos registrados por suas irmãs do Carmelo), o legado de Santa Teresinha está por inteiro em sua famosa obra ‘História de uma alma’ (publicado originalmente em 1898), que registra, além de seus manuscritos autobiográficos e de suas proposições espirituais, as premissas e os fundamentos do seu caminho da infância espiritual. 

Nesta pequena via, a santificação começa e termina pelo propósito de fazer, de cada dia, mais um passo na peregrinação ao Céu, transformando cada ação diária, cada ato da nossa vida mundana, por mais simples e despojado que seja, em obra de perfeição cristã, compartilhado e vivido para a plena glória do Pai (‘sede perfeitos como vosso Pai do Céu é perfeito’). Nesta pequena via, a santificação é caminho simples e fácil para todos os homens e mulheres dos nossos tempos, e precisa apenas da resolução tão claramente expressa na curta vida da carmelita de Lisieux: ‘nunca distanciar a minha alma do olhar de Jesus’.