segunda-feira, 8 de setembro de 2014

GLÓRIAS DE MARIA: FESTA DA NATIVIDADE DE MARIA


Com o nascimento de Maria, Deus dá ao mundo a aurora que anuncia a vinda do Messias, o início histórico da obra da Redenção. Maria, 'bendita entre todas as mulheres' e rainha dos anjos, foi privilegiada pelos desígnios da Providência com as graças mais sublimes para ser elevada à excelsa dignidade de Mãe do Nosso Salvador Jesus Cristo, Mãe de Deus. 

'Deus onipotente, antes que o homem caísse, previu a sua queda e decidiu, antes dos séculos, a redenção humana. Decidiu Ele encarnar-se em Maria... Hoje é o dia em que Deus começa a pôr em prática o seu plano eterno, pois era necessário que se construísse a casa, antes que o Rei descesse para habitá-la. Casa linda, porque, se a Sabedoria constrói uma casa com sete colunas trabalhadas, este palácio de Maria está alicerçado nos sete dons do Espírito Santo. Salomão celebrou de modo soleníssimo a inauguração de um templo de pedra. Como celebraremos o nascimento de Maria, templo do Verbo encarnado?'

(Homilia sobre a Natividade de Maria, de São Pedro Damião)

A Festa da Natividade de Maria (celebrada no dia 8 de Setembro, pelo calendário tridentino) era celebrada no Oriente Católico muito antes de ser instituída no Ocidente e tem sua origem provavelmente em Jerusalém, pelos meados do século V. De acordo com a Tradição, Maria nasceu de pais virtuosos e avançados em idade, Joaquim e Ana, que cumpriam fielmente os seus preceitos cristãos em Jerusalém, resignados e pacientes diante a esterilidade do casal. Contemplados com a gravidez tardia, nasceu-lhes pela Divina Providência a filha que seria a Mãe de Deus, evento singular da história da humanidade que não foi objeto nem de profecias e nem de sinais extraordinários antes, durante ou depois da natividade de Maria.

'Ó Joaquim e Ana, casal bem-aventurado e verdadeiramente sem mancha! Pelo fruto do vosso seio fostes reconhecidos, segundo a palavra do Senhor: 'Pelos seus frutos os reconhecereis'. A vossa conduta foi agradável a Deus e digna daquela que nasceu de vós. Tendo levado uma vida casta e santa, engendrastes a joia da virgindade, aquela que deveria permanecer Virgem antes, durante e depois do parto, a única sempre Virgem de espírito, de alma e de corpo. Convinha, de fato, que a virgindade saída da castidade produzisse a Luz única e monógena, corporalmente, pela benevolência d’Aquele que A gerou sem corpo – o Ser que não gera, mas que é eternamente gerado, para Quem ser gerado é a única qualidade própria da Sua Pessoa. Ó que maravilhas, e que alianças estão neste menino! Ó Filha da esterilidade, virgindade que engravida, nela se unirão divindade e humanidade, sofrimento e impassibilidade, vida e morte, para que em todas as coisas o menos perfeito seja vencido pelo melhor! E tudo isto para minha salvação, ó Mestre! Amas-me tanto que não realizaste esta salvação nem pelos anjos, nem por nenhuma outra criatura, mas tal como já a minha criação, também a minha regeneração foi Tua obra pessoal. Assim, eu exulto, faço despertar a minha alegria e o meu júbilo, volto à fonte das maravilhas, e embriagado de uma torrente de alegria, toco de novo a cítara do espírito e canto o hino divino da natividade'.

(Homilia sobre a Natividade de Maria, de São João Damasceno)

Nasce Maria, dádiva de Deus, santíssima em sua concepção, santíssima no seio de sua mãe, santíssima desde o primeiro instante de sua vida. Pois não convinha que o santuário de Deus, a mansão da sabedoria, o relicário do Espírito Santo, a urna do maná celestial, tivesse em si a menor mácula. Antes de receber sua alma santíssima, sua carne foi completamente purificada até do menor resíduo de toda mancha, sem a mais ínfima inclinação para o pecado.

'A gloriosa Virgem não apenas foi preservada do pecado original em sua concepção, como foi também adornada da justiça original e confirmada em graça desde o primeiro momento de sua vida, segundo muitos eminentes teólogos, a fim de ser mais digna de conceber e dar à luz o Salvador do mundo. Privilégio que jamais foi concedido à criatura alguma, nem humana nem angélica, pertencendo somente à Mãe do Santo dos Santos, depois de seu Filho Jesus ... Todas as virtudes, com todos os dons e frutos do Espírito Santo, e as oito bem-aventuranças evangélicas se encontram no coração de Maria desde o momento de sua concepção, tomando inteira posse e estabelecendo n'Ela seu trono num grau altíssimo e proporcionado à eminência de sua graça'.

(Homilia, São João Eudes)


Maria Santíssima é a nova Eva, a mãe espiritual dos homens; é Judite que será vitoriosa sobre o inimigo do povo de Deus; é Ester que alcançará misericórdia para o seu povo. Foi Maria que Adão entreviu quando Deus lhe disse que uma mulher esmagaria a cabeça da serpente. Deus a tinha em vista quando prometeu a Abraão, aos patriarcas e a Davi, que o Salvador brotaria da sua estirpe. Ela é o tronco de Jessé que havia de dar a flor escolhida, conforme a profecia de Isaías. 

Genealogia de Jesus Cristo, filho de David, filho de Abraão: 2Abraão gerou Isaac;Isaac gerou Jacob; Jacob gerou Judá e seus irmãos; 3Judá gerou, de Tamar, Peres e Zera; Peres gerou Hesron; Hesron gerou Rame; 4Rame gerou Aminadab; Aminadab gerou Nachon; Nachon gerou Salmon; 5Salmon gerou, de Raab, Booz; Booz gerou, de Rute, Obed; Obed gerou Jessé;6Jessé gerou o rei David. David, da mulher de Urias, gerou Salomão; 7Salomão gerou Roboão; Roboão gerou Abias; Abias gerou Asa; 8Asa gerou Josafat; Josafat gerou Jorão; Jorão gerou Uzias; 9Uzias gerou Jotam; Jotam gerou Acaz; Acaz gerou Ezequias; 10Ezequias gerou Manassés; Manassés gerou Amon; Amon gerou Josias; 11Josias gerou Jeconias e seus irmãos, na época da deportação para Babilónia.12Depois da deportação para Babilónia, Jeconias gerou Salatiel; Salatiel gerou Zorobabel;13Zorobabel gerou Abiud. Abiud gerou Eliaquim; Eliaquim gerou Azur; 14Azur gerou Sadoc; Sadoc gerou Aquim; Aquim gerou Eliud; 15Eliud gerou Eleázar; Eleázar gerou Matan; Matan gerou Jacob. 16Jacob gerou José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, que se chama Cristo.18Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: Maria, sua mãe, estava desposada com José; antes de coabitarem, notou-se que tinha concebido pelo poder do Espírito Santo.19José, seu esposo, que era um homem justo e não queria difamá-la, resolveu deixá-la secretamente.20Andando ele a pensar nisto, eis que o anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse: 'José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que ela concebeu é obra do Espírito Santo. 21Ela dará à luz um filho, ao qual darás o nome de Jesus, porque Ele salvará o povo dos seus pecados'. 22Tudo isto aconteceu para se cumprir o que o Senhor tinha dito pelo profeta: 23Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho; e hão-de chamá-lo Emanuel, que quer dizer: Deus conosco.


(Evangelho: Mateus, 1, 1-16.18-23)

domingo, 7 de setembro de 2014

A VIRTUDE DA CORREÇÃO FRATERNA

Páginas do Evangelho - Vigésimo Terceiro Domingo do Tempo Comum


O Evangelho deste domingo é um tributo sobre o dever da correção fraterna. Reconhecer o erro e assumir o ônus da responsabilidade pelo erro cometido, são os atributos básicos do perdão. Mas o erro reverbera além daquele que o pratica e é dever - dever cristão - a sua pronta caracterização, a sua expressa condenação, o seu combate efetivo, a sua oportuna ou inoportuna contenção. A correção do erro é uma virtude cristã por excelência, quando praticada e vivida sob os ditames do reto juízo, da prudência caritativa, do verdadeiro amor fraterno: 'Se o teu irmão pecar contra ti, vai corrigi-lo, mas em particular, a sós contigo!' (Mt 18, 15).

Jesus nos adverte sobre a insensatez da omissão, do menosprezo, da condenação exaltada e pública do pecador que nos ofendeu: 'a sós contigo!' é uma proposição enfática e contundente pela correção fraterna, emanada pelo zelo apostólico e pela prudência cristã. Corrigir o erro para não se omitir em defesa da verdade; corrigir o erro sem destruir as pontes e as passagens que possam fazer o pecador retomar o caminho da verdade: 'Se ele te ouvir, tu ganhaste o teu irmão' (Mt 18, 15). Benditos aqueles que levarem consigo para Deus os que puderam fazer o caminho de volta!

A correção fraterna é oportuna e inoportuna, porque a salvação de uma alma tem valor infinitamente maior que todos os nossos queixumes ou sentimentos desprezados. Não basta a correção, é preciso insistir nela mais uma vez, e outra vez, e outra ainda. A insistência moldada pelo zelo extremado na salvação da alma do próximo é o cimento que agrega as pedras frouxas de nossa própria caminhada para Deus. 

Esse ardor de correção perpassa por terceiros e se encerra na própria vida da Igreja, Corpo Místico de Cristo, pois a perseverança da graça atrai graças em profusão e frutos extremos de conversão, piedade e misericórdia: 'se dois de vós estiverem de acordo na terra sobre qualquer coisa que quiserem pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus. Pois, onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou aí, no meio deles' (Mt 18, 19 - 20). Porém, a obstinação determinada no erro tem natureza diabólica e, portanto, não é mais passível da graça. Aqueles que optam pelo desvario do mal e se afastam dos ensinamentos da Igreja, tornam-se, então, réus de delitos eternos: 'tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu' (Mt 18, 18).

sábado, 6 de setembro de 2014

O RECOLHIMENTO NO TRABALHO


Se o recolhimento é o habitat de Deus desde toda a eternidade, e se nos foi trazido a esta terra pelo Verbo encarnado, que nele viveu, durante 33 anos de Sua vida mortal e que, até aos fins dos tempos, permanecerá no mistério silencioso da eucaristia, é, sem dúvida, que ele é o sinal das almas grandes.

As almas pequenas, mesquinhas, têm medo de sua consciência, têm pavor do seu vazio. Eis por que procuram a companhia de outros para se distraírem, o barulho para se atordoarem. É verdade que o recolhimento é estar também com Deus; mas não quer estar com Deus quem não quer estar com sua consciência. Eis por que o recolhimento é sinal de grandeza verdadeira, a dissipação é sinal das almas vulgares.

Poderíamos, de vários modos, dividir os homens que vivem uma vida digna. Mas, para o fim que, temos em vista, dividi-los-emos em três grupos apenas: os que vivem do trabalho manual, os que se dedicam ao estudo, os que fazem profissão de vida perfeita. Em outras palavras: os trabalhadores, os sábios, os santos.

RECOLHIMENTO NO TRABALHO

Uma das mais belas imagens do trabalho no recolhimento e do recolhimento no trabalho é, de certo, os célebres entalhadores de Deus que vivem em suas poéticas oficinas, lá no Tirol, a criarem essas figuras admiráveis de Cristo crucificado, de madeira, que, depois, serão cobiçadas pelos que conhecem a arte profunda que elas revelam, apesar da simplicidade e quase ingenuidade de seus traços.

Contava-nos, em um retiro inesquecível, um pregador franciscano, a impressão que lhe causara, em uma das suas viagens ao Tirol, a atenção edificante destes artistas anônimos em cima de sua madeira bruta, dentro da qual parece que já divisavam alguma figura linda que eles carinhosamente, pacientemente, queriam dali desentranhar. E passam os forasteiros curiosos e espiam pela janela e ficam a contemplá-los, mas o escultor não se perturba, melhor, nada vê senão o seu trabalho e continua a esculpir.

Lembremo-nos, também, destes copistas da Idade Média, debruçados sobre o pergaminho a fazerem essas letras admiráveis que venceram séculos e que cada uma tem a sua história. Por que o recordamos? Exemplos do recolhimento no trabalho. E com que espírito sobrenatural preparavam os canteiros cristãos das grandes catedrais as pedras que iriam esconder-se lá em baixo, no fundamento, ou, lá em cima, nas torres entre as nuvens! Para eles, o trabalho era oração, era serviço de Deus. Com que elevação o faziam!

Quem já não contemplou, edificado, o exemplo destes trabalhadores dos campos, colonos humildes, em geral homens de fé, que com a enxada na mão, não desviam os olhos da terra, como se a todo momento fossem descobrir um tesouro. E passa o automóvel, passa o trem, e eles não levantam os olhos do seu trabalho árduo. É o trabalho no recolhimento e o recolhimento no trabalho.

No fim do século passado, faleceu na França, em odor de santidade, uma humilde costureira, Marie Eustelle. Um artista, querendo gravar em sua tela o característico de sua santidade, pintou a donzela com a costura na mão a contemplar uma custódia eucarística [gravura acima], brilhante como o sol. Que pensamento lindo: trabalho e oração confundem-se no recolhimento.

Aliás, era a grande preocupação dos padres do deserto: a oração como disposição para o trabalho bem feito, mas também o trabalho como preparação para a oração. Tanto assim que se faltava o vime para novas cestas, desmanchavam as já feitas, para as tornarem a fazer e assim não lhes faltasse o trabalho salutar. Toda a vida conventual, até mesmo nas ordens mais dadas ao estudo de ciência e de oração, se começa pelo trabalho manual ou nas oficinas, ou nos jardins, ou na cozinha, tudo como ótima disposição para a vida espiritual e intelectual.

E uma das facetas mais encantadoras da vida nos conventos é o trabalho humilde dos irmãos leigos ou conversos, que, por toda a vida, fazem o papel de Marta, mas sem deixarem de ser Maria. E quando dois ou três trabalham juntos, como na horta ou em alguma oficina, como é belo ouvir as orações que sobem o céu, em surdina, enquanto os dedos ou braços trabalham a valer. A influência que estes trabalhadores orantes exercem é salutar. Começa-se a amar o trabalho e a ver nele uma força de elevação para Deus.

Um diretor de grande tecelagem dizia-me que nas salas de trabalho onde se faziam irradiações de música, o resultado de serviço era maior em quantidade e em perfeição. Não seria porque a música, comunicando um certo bem-estar, estabelecia um ambiente natural de recolhimento, próprio para o desenvolvimento do trabalho? A oração consegue este resultado de modo muito mais eficiente.

É por isso que os servos de Deus fazem tudo com perfeição, porque se lembram no trabalho de que a terra que lavram ou o pano que tecem serão apresentados ao Pai do céu. E, justamente, onde há mais recolhimento há mais trabalho consciente e elevado e onde há mais trabalho sério há também mais recolhimento.

Olhemos para mais um exemplo. Os cartusianos de São Bruno e os trapistas do Abade Rancé, que transformaram a sua vida em um recolhimento imperturbável, contínuo, e que, com um heroísmo edificante, guardam, há séculos, um silêncio inviolável, são os que dão mais belo exemplo de trabalho. Cada filho de São Bruno, também os sacerdotes, ao lado de sua cela, onde rezam e estudam, tem a sua oficina, onde transmudam o trabalho no ferro, ou na madeira, em poemas que sobem ao céu. Os trapistas todos, sem excetuar o próprio Abade, se entregam, oito horas por dia, ao estudo e ao trabalho, sendo que boa parte ao trabalho do campo, fazendo coisas extraordinárias, como os importantes arrozais dos campos de Tremembé, em São Paulo.

Não há dúvida, a experiência no-lo diz, quando o homem está recolhido, o trabalho rende e é feito com inteligência e elevação, por mais modesto que seja. A reta intenção, tão recomendada pelos mestres de vida espiritual, antes das ações principais, forma o ambiente, onde se desenvolverá o trabalho com proveito.

Pregávamos retiro em uma grande casa do Bom Pastor, quando vimos sem sermos visto um quadro inesquecível: umas trinta e tantas madalenas (são verdadeiras penitentes voluntárias que levam vida rigorosa) sentadas em duas filas de bancos, entregues aos seus trabalhos de mão: bordados, costuras, tricô, desenhos. Todas silenciosas, olhares sobre o trabalho - era a imagem perfeita do trabalho e do recolhimento. Com respeito as contemplamos!

O santo Cura de Ars nos aconselha que só trabalhemos naquilo que pudermos oferecer a Deus Nosso Senhor; ora, isso é aconselhar a perfeição do trabalho, que se alcança pela concentração no que se está fazendo. O recolhimento, portanto, é a força espiritual para o trabalho manual. Por ele, o homem dá às suas atividades uma nobreza que lembra, na sua humildade embora, a nobreza sem ostentação da oficina de Nazaré.

(Excertos da obra 'Recolhimento', por Dom Henrique Golland Trindad, 1945)

PRIMEIRO SÁBADO DE SETEMBRO


Mensagem de Nossa Senhora à Irmã Lúcia, vidente de Fátima: 
                                                                                                                           (Pontevedra / Espanha)

‘Olha, Minha filha, o Meu Coração cercado de espinhos que os homens ingratos a todo o momento Me cravam, com blasfêmias e ingratidões. Tu, ao menos, vê de Me consolar e diz que a todos aqueles que durante cinco meses seguidos, no primeiro sábado, se confessarem*, recebendo a Sagrada Comunhão, rezarem um Terço e Me fizerem 15 minutos de companhia, meditando nos 15 Mistérios do Rosário com o fim de Me desagravar, Eu prometo assistir-lhes à hora da morte com todas as graças necessárias para a salvação.’
* Com base em aparições posteriores, esclareceu-se que a confissão poderia não se realizar no sábado propriamente dito, mas antes, desde que feita com a intenção explícita (interiormente) de se fazê-la para fins de reparação às blasfêmias cometidas contra o Imaculado Coração de Maria no primeiro sábado seguinte.

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

HOMILIA SOBRE A NATIVIDADE DE MARIA (SÃO JOÃO DAMASCENO)

Vinde, todas as nações, vinde, homens de todas as raças, línguas e idades, de todas as condições: com alegria celebremos a natividade da alegria do mundo inteiro! Se os gregos destacavam com todo o tipo de honras – com os dons que cada um podia oferecer – o aniversário das divindades, impostos aos espíritos por mitos mentirosos que obscureciam a verdade, e também o dos reis, mesmo se eles fossem o flagelo de toda a existência, que deveríamos nós fazer para honrar o aniversário da Mãe de Deus, por quem toda a raça mortal foi transformada, por quem o castigo de Eva, nossa primeira mãe, foi mudada em alegria? Com efeito, uma ouviu a sentença divina: 'Darás à luz no meio de penas'; a outra ouviu, por seu turno: 'Alegra-te, ó Cheia de Graça'. À primeira disse-se: 'Inclinar-te-ás para o teu marido', mas à segunda: 'O Senhor está contigo'. Que homenagem ofereceremos então nós à Mãe do Verbo, senão outra palavra? Que a criação inteira se alegre e festeje, e cante a natividade de uma santa mulher, porque ela gerou para o mundo um tesouro imperecível de bondade, e porque por ela o Criador mudou toda a natureza num estado melhor, pela mediação da humanidade. Porque se o homem, que ocupa o meio entre o espírito e a matéria, é o laço de toda a criação, visível e invisível, o Verbo criador de Deus, ao se unir à natureza humana, uniu-se através dela a toda a criação. Festejemos assim o desaparecimento da humana esterilidade, pois cessou para nós a enfermidade que nos impedia a posse dos bens.

Mas porque nasceu a Virgem Maria de uma mulher estéril? Àquele que é o único verdadeiramente novo debaixo do sol, como coroamento das Suas maravilhas, deviam ser preparados os caminhos por maravilhas, para que lentamente as realidades mais baixas se elevassem de modo a serem as mais altas. E eis uma outra razão, mais alta e mais divina: a natureza cedeu o lugar à graça, pois ao vê-la tremeu, e não quis mais ter o primeiro lugar. Como a Virgem Mãe de Deus devia nascer de Ana, a natureza não ousou prevenir o fruto da graça, mas permaneceu ela própria sem fruto, até que a graça trouxesse o seu. Era necessário que fosse primogênita aquela que deveria gerar 'o Primogênito de toda a criação, no Qual tudo subsiste'. Ó Joaquim e Ana, casal venturoso! Toda a criação está em dívida para convosco, porque através de vós ela pôde oferecer ao Criador o dom – entre todos o mais excelso – de uma Mãe venerável, a única digna d’Aquele que a criou. Ditosos os rins de Joaquim, de onde saiu uma semente totalmente imaculada, e admirável o seio de Ana, graças ao qual se desenvolveu lentamente, onde se formou e de onde nasceu uma tão santa criança! Ó entranhas que levastes um céu vivo, mais vasto que a imensidade dos céus! Ó moinho onde foi amassado o Pão vivificante, segundo as próprias palavras de Cristo: 'Se o grão de trigo não cair na terra e morrer, ficará só'. Ó seio que aleitaste aquela que alimentou Aquele que alimenta o mundo! Maravilha das maravilhas, paradoxo dos paradoxos! Sim, a inexprimível Encarnação de Deus, cheia de condescendência, devia ser precedida por estas maravilhas. Mas como prosseguirei? O meu espírito está fora de si, dividido que estou entre o temor e o amor; o meu coração bate e a minha língua move-se: não posso suportar a alegria, as maravilhas deitam-me por terra, o ardor apaixonado aprisionou-me num arrebatamento divino. Que o amor vença, que o temor desapareça e que cante a cítara do Espírito: 'Alegrem-se os céus, exulte a terra'!

Hoje as portas da esterilidade abrem-se, e uma porta virginal e divina avança: a partir dela, por ela, o Deus que está acima de todos os seres deve vir ao mundo 'corporalmente', segundo a expressão de Paulo, ouvinte dos segredos inefáveis. Hoje, da raiz de Jessé saiu uma vergôntea, de onde surgirá para o mundo uma flor substancialmente unida à divindade.

(...)

Hoje, o 'Filho do Carpinteiro', O Verbo universalmente ativo d’Aquele que tudo construiu por Ele, o Braço Poderoso do Deus Altíssimo, querendo afiar pelo Espírito - que é como o seu dedo – a lâmina embotada da natureza, construiu para Si uma escada viva, cuja base está firmada na terra, com o cimo a tocar os céus: Deus repousa sobre ela. É dela a figura que Jacó contemplou, e por ela Deus desceu da Sua imobilidade, ou melhor, inclinou-Se com condescendência, tornando-Se assim 'visível sobre a terra, e conversando com os homens'. Estes símbolos representam a Sua vinda ao meio de nós, o seu abaixamento condescendente, a sua existência terrena, o verdadeiro conhecimento d’Ele próprio, dado a todos aqueles que estão sobre a terra. A escada espiritual, a Virgem, está fixa na terra, pois na terra ela tem a sua origem, mas a sua cabeça eleva-se até ao céu. A cabeça de toda a mulher é o homem, mas para ela, que não conheceu homem, Deus Pai ocupa o lugar de sua cabeça: pelo Espírito Santo, Ele concluiu uma aliança e, como semente divina e espiritual, enviou o Seu Filho e Verbo, força onipotente. Em virtude do beneplácito do Pai, não é por uma união natural, mas é superando as leis da natureza, pelo Espírito Santo e pela Virgem Maria, que o Verbo Se fez carne e habitou entre nós. É por aqui que se vê que a união de Deus com os homens se cumpre pelo Espírito Santo.

(...)

Ó Joaquim e Ana, casal bem-aventurado e verdadeiramente sem mancha! Pelo fruto do vosso seio fostes reconhecidos, segundo a palavra do Senhor: 'Pelos seus frutos os reconhecereis'. A vossa conduta foi agradável a Deus e digna daquela que nasceu de vós. Tendo levado uma vida casta e santa, engendrastes a jóia da virgindade, aquela que deveria permanecer Virgem antes, durante e depois do parto, a única sempre Virgem de espírito, de alma e de corpo. Convinha, de fato, que a virgindade saída da castidade produzisse a Luz única e monógena, corporalmente, pela benevolência d’Aquele que A gerou sem corpo – o Ser que não gera, mas que é eternamente gerado, para Quem ser gerado é a única qualidade própria da Sua Pessoa. Ó que maravilhas, e que alianças estão neste menino! Ó Filha da esterilidade, virgindade que engravida, nela se unirão divindade e humanidade, sofrimento e impassibilidade, vida e morte, para que em todas as coisas o menos perfeito seja vencido pelo melhor! E tudo isto para minha salvação, ó Mestre! Amas-me tanto que não realizaste esta salvação nem pelos anjos, nem por nenhuma outra criatura, mas tal como já a minha criação, também a minha regeneração foi Tua obra pessoal. Assim, eu exulto, faço despertar a minha alegria e o meu júbilo, volto à fonte das maravilhas, e embriagado de uma torrente de alegria, toco de novo a cítara do espírito e canto o hino divino da natividade.

(...)

Hoje, o Criador de todas as coisas, Deus Verbo, fez um livro novo, saído do coração do Pai para ser escrito, como se fosse por uma cana, pelo Espírito, que é a língua de Deus. Esse livro foi dado a um homem que conhecia as letras, mas que não o lia. José, com efeito, não conheceu Maria, nem a significação do mistério em si. Ó filha toda santa de Joaquim e de Ana, que escapaste aos olhares dos Principados e das Potestades e aos 'assédios inflamados do maligno', e que viveste no tálamo do Espírito, para seres guardada intacta e te tornares esposa de Deus e Mãe de Deus por natureza! Ó filha toda santa, que apareceste nos braços de tua mãe, tu és o terror das potências de rebelião! Ó filha toda santa, alimentada do leite maternal, e rodeada das legiões angélicas! Ó filha amada de Deus, honra de teus pais, gerações de gerações te proclamam bem aventurada, como tu própria o afirmaste com verdade! Ó filha digna de Deus, beleza da natureza humana, reabilitação de Eva, nossa primeira mãe! Por teu nascimento, aquela que tombara foi redimida. Ó filha toda santa, esplendor do sexo feminino! Se a primeira Eva, com efeito, foi culpada de transgressão, e se por sua causa a morte fez a sua entrada no mundo (porque ela se colocou ao serviço da serpente contra o nosso primeiro pai), Maria, que se fez a serva da vontade divina, enganou a serpente enganadora e introduziu no mundo a imortalidade.

Ó filha sempre Virgem, que pode conceber sem intervenção humana, porque Aquele que concebeste tem um Pai Eterno! Ó filha da raça terrena, que levas em teus braços divinamente maternais o Criador! Os séculos rivalizavam entre si para saber qual deles se honraria de te ver nascer, mas o desígnio fixado antecipadamente de Deus, 'que fez os séculos' colocou fim a essa rivalidade, e os últimos tornaram-se os primeiros, eles a quem foi atribuída a felicidade da tua Natividade. Na verdade, tu és mais preciosa que toda a criação, pois só de ti o Criador recebeu em partilha as primícias da nossa matéria humana. A Sua Carne foi feita da tua carne, o Seu Sangue do teu sangue; Deus alimentou-Se do teu leite, e os teus lábios tocaram os lábios de Deus. Ó maravilhas incompreensíveis e inefáveis! Na presciência da tua dignidade, amou-te o Deus do universo; porque te amou, predestinou-te, e nos últimos tempos, chamou-te à existência, e constituiu-te Mãe para gerar um Deus e alimentar o Seu próprio Filho e Verbo.

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'Uma vinha de belos sarmentos' foi gerada no seio de Ana, e ela produziu um fruto cheio de doçura, fonte de um néctar abundante de vida eterna para os habitantes da terra. Joaquim e Ana fizeram-se semeadores de justiça, e recolheram um fruto de vida. Eles foram iluminados pela luz do conhecimento, procuraram o Senhor, e daí lhes veio um fruto de justiça. Que a terra tenha confiança! 'Filhos de Sião, alegrai-vos no Senhor vosso Deus, porque o deserto ficou verdejante': aquela que era estéril deu o seu fruto; Joaquim e Ana, como montanhas místicas, fizeram brotar vinho doce. Permanece na alegria, ó Ana venturosa, por teres dado à luz uma mulher, porque essa mulher será a Mãe de Deus, porta da luz, fonte de vida, e reduzirá a nada a acusação que pesava sobre a mulher.

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Ó mulher amabilíssima, três vezes bem-aventurada! 'Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o fruto do teu ventre'! Ó mulher, filha do Rei Davi e Mãe de Deus, Rei do Universo! Ó divina e vivente obra-prima, na qual Deus Criador Se alegrou, de quem o espírito é governado por Deus e atento somente a Ele, e de quem todo o desejo se eleva apenas Àquele que é o único amável e desejável, que não te encolerizas senão contra o pecado e contra aquele que o fez nascer! Terás uma vida superior à natureza, porque não é para ti que a terás, já que também não é para ti que tu nasceste. Terás antes a tua vida para Deus, e é por causa d’Ele que vieste à vida, por causa de Quem servirás à salvação universal, para que o antigo desígnio de Deus, a Encarnação do Verbo e a nossa divinização, se cumpra através de ti. A tua vontade é alimentares-te das palavras divinas e fortificares-te com a sua seiva, como 'oliveira fecunda na casa de Deus', como 'árvore plantada à beira das águas' do Espírito, como árvore da vida, que deu o seu fruto no tempo que lhe foi destinado: o fruto que é o Deus Encarnado, Vida eterna de todos os seres. Guardas todo pensamento bom e útil para a alma, mas todo aquele que é supérfluo e que seria um perigo para a alma tu o rejeitas ainda antes de o provar. Os teus olhos estão sempre voltados para o Senhor, olhando a luz eterna e inacessível. Teus ouvidos escutam a palavra de Deus e deleitam-se com a cítara do Espírito; foi por eles que o Verbo entrou para Se fazer Carne. Tuas narinas respiram deliciadas o aroma dos perfumes do Esposo, que é Ele próprio um perfume, espontaneamente derramado para perfumar a Sua humanidade: 'O teu nome é um perfume que se espalha', diz a Escritura. Os teus lábios louvam o Senhor, e estão ligados aos Seus lábios. A tua língua e o teu palato discernem as palavras de Deus e saciam-se com a suavidade divina. Ó coração puro e sem mácula, que vê e deseja o Deus imaculado!

É neste seio que o Ser ilimitado veio habitar; do seu leite se alimentou Deus, o Menino Jesus. Ó porta de Deus, sempre virginal! Eis as mãos que suportam Deus, e esses joelhos que são um trono mais elevado que os querubins: por eles 'as mãos fracas e os joelhos trêmulos' foram fortalecidos. Os seus pés são guiados pela lei de Deus como por uma lâmpada que brilha, e correm após Ele sem se voltarem, até que tenham feito chegar aquela que ama junto do Bem-Amado. Em todo o seu ser ela é o tálamo do Espírito, a Cidade de Deus Vivo, que 'alegra os canais do rio', isto é, as correntes dos carismas do Espírito: 'Toda bela, toda próxima de Deus'. Dominando os querubins, mais alta que os serafins, próxima de Deus: é a ela que esta palavra se aplica!

(...)

Eu te saúdo, Maria, filha dulcíssima de Ana. De novo para ti o amor me impele. Como descrever o teu caminhar cheio de seriedade, os teus vestidos, a graça de teu rosto, a maturidade do discernimento num corpo juvenil? A tua forma de estar foi modesta, distante de todo o luxo e de toda a indolência; o teu caminhar era grave, sem precipitação, sem preguiça; o teu caráter era sério, temperado de júbilo, de uma perfeita reserva a propósito dos homens – disto é testemunho a inquietação que te surgiu aquando da proposta inesperada do anjo. A teus pais, dócil e obediente, tinhas humildes sentimentos nas mais altas contemplações, palavra amável, provinda de uma alma pacífica. Em resumo: que outra digna morada senão tu para Deus? Com razão todas as gerações te proclamam bem-aventurada, ó glória insigne da humanidade! Tu és a honra do sacerdócio, a esperança dos cristãos, a planta fecunda da virgindade, porque é através de ti que o renome da virgindade se estendeu aos confins do mundo. 'Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o Fruto do teu ventre'. Aqueles que confessam a tua maternidade divina são benditos, e malditos aqueles que a negam.

Joaquim e Ana, casal abençoado, recebei de mim estas palavras de aniversário. Ó filha de Joaquim e de Ana, ó Soberana, acolhe a palavra deste teu servo pecador, mas inflamada pelo amor, e para quem tu és a única esperança de alegria, a protetora da vida e, junto de teu Filho, a reconciliadora e firme garantia da salvação. Possa tu aliviar-me do fardo dos meus pecados, dissipar a névoa que obscurece o meu espírito e o peso que me agarra à matéria. Possas tu deter as tentações, governar felizmente a minha vida e conduzir-me pela mão até à felicidade do Alto. Concede ao mundo a paz, e a todos os habitantes ortodoxos desta cidade uma alegria perfeita e a salvação eterna, pelas orações de teus pais e de todo o Corpo da Igreja. Assim seja, assim seja! 'Salve, ó cheia de graça, o Senhor está contigo! Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o fruto de teu ventre', Jesus Cristo, o Filho de Deus. A Ele a Glória, com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

(Excertos da homilia, São João Damasceno, Pai da Igreja)

PORQUE HOJE É A PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS


A Grande Revelação do Sagrado Coração de Jesus foi feita a Santa Margarida Maria Alacoque  durante a oitava da festa de Corpus Christi  de 1675...

         “Eis o Coração que tanto amou os homens, que nada poupou, até se esgotar e se consumir para lhes testemunhar seu amor. Como reconhecimento, não recebo da maior parte deles senão ingratidões, pelas suas irreverências, sacrilégios, e pela tibieza e desprezo que têm para comigo na Eucaristia. Entretanto, o que Me é mais sensível é que há corações consagrados que agem assim. Por isto te peço que a primeira sexta-feira após a oitava do Santíssimo Sacramento seja dedicada a uma festa particular para  honrar Meu Coração, comungando neste dia, e O reparando pelos insultos que recebeu durante o tempo em que foi exposto sobre os altares ... Prometo-te que Meu Coração se dilatará para derramar os influxos de Seu amor divino sobre aqueles que Lhe prestarem esta honra”.


... e as doze Promessas:
  1. A minha bênção permanecerá sobre as casas em que se achar exposta e venerada a imagem de meu Sagrado Coração.
  2. Eu darei aos devotos do meu Coração todas as graças necessárias a seu estado.
  3. Estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias.
  4. Eu os consolarei em todas as suas aflições.
  5. Serei seu refúgio seguro na vida, e principalmente na hora da morte.
  6. Lançarei bênçãos abundantes sobre todos os seus trabalhos e empreendimentos.
  7. Os pecadores encontrarão em meu Coração fonte inesgotável de misericórdias.
  8. As almas tíbias se tornarão fervorosas pela prática dessa devoção.
  9. As almas fervorosas subirão em pouco tempo a uma alta perfeição.
  10. Darei aos sacerdotes que praticarem especialmente essa devoção o poder de tocar os corações mais empedernidos.
  11. As pessoas que propagarem esta devoção terão os seus nomes inscritos para sempre no meu Coração.
  12. A todos os que comungarem nas primeiras sextas-feiras de nove meses consecutivos, darei a graça da perseverança final e da salvação eterna.

    ATO DE DESAGRAVO AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS 
    (rezai-o sempre, particularmente nas primeiras sextas-feiras de cada mês)

Dulcíssimo Jesus, cuja infinita caridade para com os homens é deles tão ingratamente correspondida com esquecimentos, friezas e desprezos, eis-nos aqui prostrados, diante do vosso altar, para vos desagravarmos, com especiais homenagens, da insensibilidade tão insensata e das nefandas injúrias com que é de toda parte alvejado o vosso dulcíssimo Coração.

Reconhecendo, porém, com a mais profunda dor, que também nós, mais de uma vez, cometemos as mesmas indignidades, para nós, em primeiro lugar, imploramos a vossa misericórdia, prontos a expiar não só as nossas próprias culpas, senão também as daqueles que, errando longe do caminho da salvação, ou se obstinam na sua infidelidade, não vos querendo como pastor e guia, ou, conspurcando as promessas do batismo, renegam o jugo suave da vossa santa Lei.

De todos estes tão deploráveis crimes, Senhor, queremos nós hoje desagravar-vos, mas particularmente das licenças dos costumes e imodéstias do vestido, de tantos laços de corrupção armados à inocência, da violação dos dias santificados, das execrandas blasfêmias contra vós e vossos santos, dos insultos ao vosso vigário e a todo o vosso clero, do desprezo e das horrendas e sacrílegas profanações do Sacramento do divino Amor, e enfim, dos atentados e rebeldias oficiais das nações contra os direitos e o magistério da vossa Igreja.

Oh, se pudéssemos lavar com o próprio sangue tantas iniquidades! Entretanto, para reparar a honra divina ultrajada, vos oferecemos, juntamente com os merecimentos da Virgem Mãe, de todos os santos e almas piedosas, aquela infinita satisfação que vós oferecestes ao Eterno Pai sobre a cruz, e que não cessais de renovar todos os dias sobre os nossos altares.

Ajudai-nos, Senhor, com o auxílio da vossa graça, para que possamos, como é nosso firme propósito, com a viveza da fé, com a pureza dos costumes, com a fiel observância da lei e caridade evangélicas, reparar todos os pecados cometidos por nós e por nossos próximos, impedir, por todos os meios, novas injúrias à vossa divina Majestade e atrair ao vosso serviço o maior número possível de almas.

Recebei, ó Jesus de Infinito Amor, pelas mãos de Maria Santíssima Reparadora, a espontânea homenagem deste nosso desagravo, e concedei-nos a grande graça de perseverarmos constantes até a morte no fiel cumprimento dos nossos deveres e no vosso santo serviço, para que possamos chegar todos à Pátria bem-aventurada, onde vós, com o Pai e o Espírito Santo, viveis e reinais, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

À SEMELHANÇA DE JESUS


Em certas horas encontro-me tão triste, que até a própria vida me pesa. Mas, refletindo um pouco, vejo que é tudo questão do amor próprio ofendido, ou de alguma paixão contrariada. Disseram-me alguma palavra humilhante, mimosearam-me com exprobrações injustas ou palavras injuriosas, fui malsinado por aqueles mesmos cuja estima me é tão cara e preciosa. E por tudo isto me deixo dominar da melancolia? Que cabeça pequenina a minha! Não foi Jesus tratado pior do que eu? Não lhe chegaram a dizer que era dado ao vinho, que era um furibundo, um possesso do demônio? Portanto, porque hei de entristecer-me? Reparando bem, toda esta aparente desonra que me aflige, não representa senão um traço de semelhança entre mim e Jesus. E será isto um mal?

Como? Eu assemelhar-me a Jesus? Eu pensava que para isso bastava orar um pouco como Ele, trabalhar um pouco como Ele, dizer algumas palavras santas como as suas, fazer algumas carícias às crianças, arremessar algumas setas contra os escribas e fariseus, como era seu costume. Mas esquecia que tudo isto é muito pouco e que, para ter parecenças com Jesus, tenho de tomar uma certa cruz e, com a cruz, quantas coisas amargas e pesadas!

E, contudo, é assim mesmo: a semelhança com Jesus demanda humilhações e humilhações, e depois ainda humilhações. E preciso ser-se mal compreendido e interpretado nas coisas mais evidentes e mais justas; passar por hipócrita quando se é franco e sincero; ser tido por egoísta quando se fez um sacrifício pelo próximo; ser acoimado de imbecil quando se perdoa e se ama um ofensor; ser perseguido pela calúnia pelo temor que uma virtude nossa vá ofuscar o falso esplendor duma hipocrisia; ser amaldiçoado quando só bênçãos se mereceram... 

São coisas que queimam a alma como botões de fogo; mas como lhe fazem bem! Que prazer, quando se tem os olhos cheios de lágrimas, poder dizer, olhando o Tabernáculo: também Jesus chorou assim; quando o coração transborda de amargura e de dor, poder dizer: também Jesus sofreu assim; quando se cai por terra sob o peso duma cruz enorme, poder dizer: também a Jesus aconteceu assim. São gostos estranhos para o mundo, mas para a alma eucarística tem uma tal doçura e sublimidade, que ela estaria sempre sobre a via do Calvário para granjeá-las todos os dias. Para a alma eucarística... Mas para mim, que sou muito diverso, como encontro eu estes gostos?

Agora, compreendo porque quando olho o Crucifixo sinto no coração um não sei quê, como que um remorso. Acontece-me como a um homem vaidoso que, vendo-se ao espelho, se encontra disforme. Basta; já sei onde está o retrato de Jesus. Irei contemplá-lo e farei confrontos. Serão odiosos à minha soberba, mas paciência! Afinal, tendo eu sofrido tantas coisas no passado para aviltar a minha alma, serei agora um louco se sofrer um pouco para me assemelhar a Jesus?

(Excertos da obra 'Centelhas Eucarísticas', de original italiano, 1906; trad. de Adolfo Tarroso Gomes, 1924)