sexta-feira, 27 de junho de 2025

POEMAS PARA REZAR (LXI)


 TRANSFIGURAÇÃO

Meu Deus, aqui estou com pés e mãos atados,
grossas correntes freiam meus ombros e braços
minha cabeça jaz imóvel e engastada 
sobre o meu corpo rígido e desfigurado.

Tenho olhos para olhar mas olho o chão
tenho a boca ansiosa por falar e que se cala
almejo passos que não me levam a lugar algum
e mãos que não conhecem afagos nem abraços

Que coração é esse que só pulsa o sangue
que mantém vivo um organismo morto?
Que mente é essa que me rouba os tesouros
do mais íntimo clamor da minha alma?

Esse ser medonho e de inconsolável desespero
sou eu refém de minhas vontades e fantasias
submerso em mim, inflado de mim, sedento de mim
parasita que se alimenta do que eu sempre fui.

Ah não, Senhor, que é vã essa miragem
de criatura vã e inútil desse mundo;
dai-me a graça, que o vosso Santo Espírito
ilumine meu caminho de volta e conversão! 

E, então, rompei esta couraça da miséria trama
arrebentai as algemas deste infortúnio extremo,
tirai os meus olhos do chão e o coração do peito
para que pulse amor muito mais que sangue.

Libertai meus pés e mãos da mundana sanha
de me submergir na minha própria lama
Erguei meu corpo e fazei ascender da terra
uma árvore boa que dê frutos bons! 

Não ser mais o eu de tão desditosa sorte
eis o que vos imploro, ó Senhor meu Deus,
roubai do corpo que sucumbe à morte
a minha alma sedenta de ganhar os Céus!

(Arcos de Pilares)