sexta-feira, 11 de abril de 2025

GALERIA DE ARTE SACRA (XLI)

Apeles de Cós foi um renomado pintor da Grécia antiga, considerado geralmente como o maior pintor da antiguidade. Uma de suas pinturas mais famosas foi 'A Calúnia' que, como as suas demais obras, se perderam por completo, mas cujo tema e detalhes da composição original foram descritos e conservados. Vários pintores renascentistas italianos, ciosos destas descrições, buscaram repetir os seus temas, como esta obra 'A Calúnia' de Sandro Botticelli (1445 - 1510), datada de 1494/95.

A pintura é composta por dez figuras emblemáticas: um rei detentor do poder de juiz, um jovem réu impotente ao veredito e personificações diversas das virtudes e dos vícios que envolvem o julgamento dos homens. A Calúnia - a jovem de azul e branco portando uma tocha acesa - arrasta o jovem inocente pelos cabelos e a nudez dele (que, com as mãos unidas, clama aos Céus por justiça) é uma constatação da sua inocência do crime de calúnia que lhe é imputado (exposto pelo simbolismo do corpo arrastado pelo chão e puxado pelos cabelos). Duas jovens - a Fraude ou Malícia (posicionada atrás da Calúnia) e a Perfídia (trajada em vermelho e amarelo) amparam e sustentam a figura da Calúnia, conformando um núcleo central comum do objeto da difamação. Um passo à frente, como sinal da origem da iniquidade, encontra-se a Inveja, dissimulada no homem encapuçado e acusador.


O juiz iníquo e desonesto é retratado pela aceitação passiva da ousadia da Inveja que empunha o seu braço acusador até a fronte do próprio rei, turvando-lhe a visão. A sentença justa é ainda mais abortada pela ação conjunta da Suspeição (em primeiro plano) e da Estupidez (ou Ignorância) ao fundo, que se precipitam sobre o juiz em seu momento de veredito (mão estendida para a frente, mas subjacente à do acusador). O rei teria, então, grandes orelhas de burro, símbolos de sua tolice e submissão.


Ao fundo da cena, como símbolos ausentes do enquadramento final do processo, a Verdade (nua e crua) e o Arrependimento (simbolizado por uma velha encurvada em vestes negras e desgastadas) agora estão juntos, mas igualmente vencidos. Na abordagem de reconstituição de uma pintura grega antiga, várias estátuas e frisos do período foram introduzidos para compor o cenário de fundo da obra retratada.

Uma reinterpretação do mesmo tema é apresentada na figura abaixo, que consiste na reconstituição da 'Calúnia de Apeles" pelas mãos do pintor holandês Cornelis Cort (1533 - 1578).