REFLEXÕES SOBRE AS SETE PALAVRAS DE JESUS NA CRUZ E DAS SETE PALAVRAS DE NOSSA SENHORA NOS EVANGELHOS
                                                                                             (Arcebispo Fulton Sheen)
PRIMEIRA PALAVRA
A primeira expressão de Nosso Senhor na Cruz foi esta: 'Perdoai-lhes, Pai, porque eles não sabem o que fazem'. Não é a sabedoria do mundo que salva, mas a ignorância. Se os carrascos soubessem o que de horrível faziam, quando repeliam  o  Filho  do Homem;  se,  sabendo  que  Ele  era  o  Filho  de  Deus,  tivessem  continuado  deliberadamente  a provocar-lhe  a  morte,  então  não  haveria  esperança  de  os  pecadores  se  salvarem.  Foi  por  virtude  da  ignorância  da blasfêmia que praticavam que eles foram chamados a ouvir cair sobre si às palavras de perdão, e a obtê-lo. 
Esta primeira expressão lembra a Maria a sua. Também Ela dizia respeito à ignorância. Quando o anjo lhe anunciou que  ia  ser mãe  do  Filho  de  Deus,  perguntara: 'Como  pode  ser  isso,  se  não  conheci  varão?' Ignorância,  aqui, significava inocência, virtude, virgindade. Ignorância que se confessa não é ignorância da verdade, mas ignorância do mal. 
Jesus  perdoa  aos  pecadores  que  são  ignorantes,  mas  não  os  anjos  rebeldes  que  sabiam  o  que  faziam  e  que,  por consequência, tinham-se colocado fora da Redenção. Maria é bendita, porque era ignorante do homem, devido ao seu voto de virgindade. As duas expressões unem-se aqui numa só dor para Jesus e para Maria: a dor de ver que os homens não possuem a verdadeira sabedoria, aquela que só às crianças é dada: eles ignoram que só Cristo os pode salvar. 
SEGUNDA PALAVRA
A  segunda  expressão  de  Cristo  foi  dirigida  ao  ladrão  arrependido.  Este  começou  por  blasfemar  contra  Ele,  mas,  ao ouvir as palavras de perdão, ao ver a beleza de sua Mãe, correspondeu à graça; considera o seu castigo como 'uma recompensa dos seus crimes'. A vista do Homem na cruz central, obedecendo à vontade do seu Pai, leva-o a aceitar a sua própria cruz, como provinha da vontade de Deus. E então lança ele um supremo apelo ao perdão, e Cristo lhe responde: 'Hoje estarás comigo no Paraíso'. 
Esta magnífica aceitação dos seus sofrimentos, por parte do ladrão, para expiar as suas faltas, faz que Maria se lembre da outra palavra do Anjo. Quando este lhe disse que Ela ia ser mãe d’Aquele a quem Isaías descreveu como o homem batido e afligido por Deus, proferiu a sua segunda palavra: Fiat. 'Faça-se em mim a tua palavra'. Não há nada no Universo  que  mais  importância  tenha  do  que  fazer  a  vontade  de  Deus,  ainda  que  isso  leve  ao  ladrão  um suplício, e uma dor Àquela que se tem de pé junto da Cruz. 
O Fiat de Maria foi uma dos grandes Fiats do mundo: um fez a luz, o outro aceitou a vontade do Pai, no Jardim das Oliveiras. Quanto ao de Maria, traduz-se na aceitação de uma outra vida, em que Ela se esquecerá de si própria, para ser a companheira da Cruz. O Coração de Jesus e o Coração de Maria formaram um só no Monte do Calvário, pela submissão à vontade do Pai. 
Cada um tem a sua cruz no mundo, mas não há duas cruzes que sejam idênticas. A de Nosso Senhor era a Cruz da Redenção para os pecados do Mundo; a de Nossa Senhora foi uma vida inteira de união com a Cruz. Quanto  à  do  ladrão,  consistiu  em  suportar  a  agonia  na  cruz,  como  prelúdio  de  uma  coroa.  Uma  vez  que  a  nossa liberdade é a única coisa que possuímos como própria, constitui a mais perfeita oferenda que a Deus podemos fazer. 
TERCEIRA PALAVRA
A primeira palavra de Nosso Senhor era para os seus carrascos; a segunda para os pecadores; a terceira foi dirigida à sua Mãe e a São João. Palavra de saudação e, no entanto, mercê dessa palavra, todas as relações humanas foram modificadas. Jesus chama  a sua  Mãe 'Mulher',  e  a João 'Filho' – 'Mulher,  eis  ai  o  teu  Filho' – 'Filho,  eis  aí  a tua Mãe.' É a ordem dada a todos os que irão querer segui-lo, para que vejam em sua Mãe a própria Mãe deles. Tudo o mais Ele o dera. Ia agora dar-se também. Mas, naturalmente, voltaria a encontrá-la, como Mãe do seu Corpo Místico. 
A terceira expressão de Maria foi também uma saudação. Não sabemos com rigor quais as palavras que empregou, mas sabemos que ia visitar e cumprimentar sua prima Isabel. Nesta cena evangélica, havia também um João – João Batista – que proclamava Maria como sua Mãe. Isabel, sentindo seu filho agitar-se de alegria em seu próprio ventre, fala, por sua vez, e dirige-se a Maria como 'Mãe de Deus'. Dois meninos estabelecem relações ainda mesmo antes de nascerem! 
Quando  Jesus,  na  Cruz,  proferia  a sua  terceira  expressão,  pensava  Maria  na  sua.  Na  Visitação,  era  portadora  da influência de Cristo, antes mesmo de Ele ter nascido; no Calvário, estava destinada a ser Mãe de todos aqueles que quisessem renascer. O nascimento de Jesus nenhuma dor lhe causou. Mas o de João e de milhões de entre nós, ao pé da Cruz, tal agonia lhe  levaram,  que  Ela  bem  mereceu  o  título  de  Rainha  dos  Mártires. Jesus sacrificou-nos sua  Mãe,  para  dela  fazer nossa Mãe. Maria sacrificou o seu Divino Filho, para de nós fazer os seus filhos. Triste troca! Mas Ela estava convencida de que valia bem a pena. 
QUARTA PALAVRA
A quarta palavra da Santíssima Virgem foi o seu Magnificat; a quarta expressão de Nosso Senhor é tirada do salmo vinte e um, que começa com este desabafo de tristeza: 'Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?' – mas que, todavia,  termina  quase  como  o  canto  de  Maria: 'Os  pobres  comerão  e  ficarão  saciados;  os  extremos  da  Terra  se lembrarão do Senhor e a Ele adorarão.' Os dois cânticos elevam-se, sem que seja dado nenhum sinal de segura vitória. 
Como parece fraca, quando a consideramos apenas pelo lado humano, essa Mulher que mergulha os seus olhares até ao fim dos  tempos  e  que  profetiza: 'todas  as  gerações  me chamarão  bem-aventurada!' E  como,  pelo  lado  humano, se  nos afigura sem esperança o desejo d’Aquele que ao mundo veio para se apoderar da Terra e que, repelido agora por ela, clama por seu Pai! Mas,  para  Jesus  e  para  Maria,  há  tesouros  na  noite:  para  Maria,  na  noite  de uma  Mulher;  para  Jesus,  na  noite  do Gólgota. Só aqueles que marcham na noite vêem as estrelas. 
QUINTA PALAVRA
A quinta expressão de Maria foi proferida quando Ela interroga Jesus: 'Meu Filho! Porque procedeste assim conosco? Vosso  pai  e  eu  Te  procurávamos  aflitos.' É  essa  a  expressão  de  todas  as  criaturas  à  procura  de  Deus.  A  quinta expressão de Nosso Senhor é a do Criador à procura do homem: 'Tenho sede'. Não é a sede das águas da Terra, mas das almas. 
As  palavras  de  Maria  resumem  as  aspirações  de  todas  as  almas  em  relação  a  Cristo,  e  as  palavras  de  Cristo consubstanciam  o seu  amor  por  cada  uma  das  almas  que  Ele criou.  Ora,  no  mundo,  só  existe  uma  coisa  capaz  de impedir  esse  encontro:  é  a  vontade  do  homem.  Para  encontrar  Deus,  é  preciso  querer.  Do  contrário,  Ele  parecerá sempre que é um Deus que se esconde. 
SEXTA PALAVRA
A  sexta  expressão  de  Maria  tinha  sido  uma  simples  prece: 'Eles  não  têm  vinho':  palavras  que  apressaram  Nosso Senhor  a  realizar  o seu  primeiro  milagre  e  a  meter-se  no  caminho  real  do  Calvário.  Depois  de  Nosso  Senhor  ter saboreado,  na  Cruz,  o vinho que lhe  foi dado  por um soldado,  disse Ele: 'Tudo  está consumado.' Essa 'hora',  que Maria tinha, por assim dizer, começado, quando Cristo transmutou a água em vinho, está agora terminada: o vinho da sua vida transformou-se em Sangue: o Sangue do seu Sacrifício. 
Em Caná, Maria mandava o seu Filho para a Cruz; no Calvário, Cristo declara que terminou o seu trabalho de Redenção. O Coração Imaculado de Maria era o altar vivo sobre o qual o Sagrado Coração de Jesus se oferecia em sacrifício, e Maria não ignorava que, a partir desse momento, os homens só seriam salvos pela oferenda do Filho de Deus.
SÉTIMA PALAVRA
As últimas palavras de Maria, referidas pelo Evangelho, são as de abandono completo à vontade de Deus: 'Fazei tudo o que Ele vos disser' (Jo 11-5). Na Transfiguração, o Pai Celeste fala assim: 'Eis o meu Filho bem-amado, escutai-o'. E Maria lança este supremo apelo: 'Fazei a sua Vontade.' As últimas palavras de Jesus, na Cruz, foram aquelas pelas quais Ele abandonou a sua vida à vontade de Deus: 'Pai, nas tuas mãos encomendo o meu espírito.' 
Maria abandonou-se a Jesus, e Jesus abandonou-se ao seu Pai. Fazer a vontade de Deus, até a morte, tal o segredo de toda a santidade. E  aqui  Jesus  nos  ensina  a  morrer,  porque  se  Ele  quis  ter a sua  Mãe  junto  de si,  na  suprema  hora  do seu  grande abandono, como nos atreveríamos nós a deixar de dizer a ela, diariamente: 'Rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém'!





