terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

A BÍBLIA EXPLICADA (X)

O que era o Sinédrio?

O Sinédrio era a Corte Suprema da lei judaica, que tinha a missão de administrar a justiça interpretando e aplicando a Torá, quer oral quer escrita. Ao mesmo tempo, assumia a representação do povo judaico perante a autoridade romana. De acordo com uma antiga tradição, tinha setenta e um membros, herdeiros – segundo se supunha – das tarefas desempenhadas pelos setenta anciãos que ajudavam Moisés na administração da justiça, junto com o próprio Moisés. Desenvolveu-se, integrando representantes da nobreza sacerdotal e das famílias mais notáveis, possivelmente durante o período persa, isto é, a partir do século V-IV a.C. É mencionado pela primeira vez, embora com o nome gerousía (conselho de anciãos), no tempo do rei Antíoco III da Síria (223-187 a.C.). Com o nome de synedrion está testemunhado desde e reinado de Hircano II (63-40 a.C.). Nesses momentos era presidido pelo monarca Asmoneu, que também era sumo sacerdote.


Herodes, o Grande, no começo do seu reinado, mandou executar grande parte dos seus membros –quarenta e cinco, segundo Flávio Josefo (Antiquitates Iudaicae 15, 6) – porque o conselho se tinha atrevido a recordar-lhe os limites em que devia levar a cabo seu poder. Substituiu-os por personagens submissos aos seus desejos. Durante o seu reinado, e depois, no tempo de Arquelau, o Sinédrio teve pouca importância.

Na época dos governadores romanos – também na de Pôncio Pilatos – o Sinédrio exerceu de novo as suas funções judiciais, em processos civis e penais, dentro do território da Judeia. Nesses momentos, as suas relações com a administração romana eram fluidas e o relativo âmbito de autonomia que gozava estava em consonância com a política romana habitual nos territórios conquistados. Contudo, o mais provável é que nesses momentos a potestas gladii, isto é, a capacidade de decretar uma sentença de morte, estaria reservada ao governador romano (praefectus) que, como era habitual nesses momentos, teria recebido do imperador amplos poderes judiciais, e entre eles essa potestade. 

A reunião dos seus membros durante a noite para interrogar Jesus não foi mais do que uma investigação preliminar para delinear as acusações que mereciam a pena capital e apresentá-las contra Jesus, na manhã seguinte, no processo perante o prefeito romano.

Quem foi Caifás?

Caifás (Joseph Caiaphas) foi um sumo sacerdote contemporâneo de Jesus. É citado várias vezes no Novo Testamento (Mt 26,3; 26,57; Lc 3,2; 11,49; 18,13-14; Jo 18, 24.28; At 4,6). O historiador judeu Flávio Josefo disse que Caifás acedeu ao sumo sacerdócio por volta do ano 18, nomeado por Valério Grato, e que foi deposto por Vitélio por volta do ano 36 (Antiquitates Iudaicae, 18.2.2 e 18.4.3). Estava casado com uma filha de Anás. Também segundo Flávio Josefo, Anás tinha sido o sumo sacerdote entre os anos 6 e 15 (Antiquitates Iudaicae, 18.2.1 e 18.2.2). De acordo com estas datas, e com o que assinalam também os evangelhos, Caifás era o sumo sacerdote quando Jesus foi condenado à morte na cruz. 

A sua longa permanência no sumo sacerdócio é um indício muito significativo de que mantinha relações muito cordiais com a administração romana – também durante a administração de Pilatos. Nos escritos de Flávio Josefo, são mencionados em várias ocasiões os insultos de Pilatos à identidade religiosa e nacional dos judeus, e as vozes de personagens concretos que se elevaram protestando contra ele. A ausência do nome de Caifás – que era e o sumo sacerdote precisamente nesse momento – entre aqueles que se queixaram dos abusos de Pilatos, manifesta as boas relações que havia entre ambos. Essa mesma atitude de aproximação e colaboração com a autoridade romana é a que se reflete também no que contam os evangelhos durante o processo de Jesus e a sua condenação à morte na cruz. 

Todos os relatos evangélicos coincidem em afirmar que após o interrogatório de Jesus, os príncipes dos sacerdotes concordaram em entregá-Lo a Pilatos (Mt 27, 1-2; Mc 15, 1; Lc 23, 1 e Jo 18, 28). Para ver como entenderam os primeiros cristãos a morte de Jesus, é significativo o que narra São João no seu evangelho, acerca das deliberações prévias à condenação: 'um deles, chamado Caifás, que era o Sumo Sacerdote naquele ano, disse-lhes: 'Vós não sabeis nada, nem considerais que vos convém que morra um homem pelo povo e que não pereça toda a nação!'. Ora ele não disse isto por si mesmo [assinala o evangelista], mas, como era Sumo Sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus devia morrer pela nação, e não somente pela nação, mas também para unir num só corpo os filhos de Deus dispersos' (Jo 11, 49-52). 

Em 1990, apareceram na necrópole de Talpiot em Jerusalém doze ossários, um dos quais com a inscrição Joseph bar Kaiapha, com o mesmo nome que Flávio Josefo atribui a Caifás. Trata-se de ossários do século I, e os restos contidos nesse recipiente podiam muito bem ser os do personagem mencionado nos evangelhos.

(Da obra 'Jesus Cristo e a Igreja' - Universidade de Navarra)

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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

O DOM DA PIEDADE

O dom do Temor de Deus destina-se a curar em nós a chaga do orgulho; o dom da Piedade é derramado em nossas almas pelo Espírito Santo para combater o egoísmo, que é uma das paixões más do homem decaído por causa do pecado original, e o segundo obstáculo à sua união com Deus. O coração do cristão não deve ser nem frio nem indiferente; é preciso que seja terno e devotado; do contrário não poderá se elevar à via para a qual Deus, que é amor, dignou-se chamá-lo.

Assim o Espírito Santo produz no homem o Dom da Piedade, inspirando-lhe um retorno filial para seu Criador. 'Vós recebestes o Espírito de adoção', nos diz o Apóstolo, 'e é por este Espírito que gritamos para Deus: Pai! Pai!'. Essa disposição torna a alma sensível a tudo o que toca a honra de Deus. Faz o homem alimentar em si mesmo a compunção de seus pecados, tendo em vista a infinita Bondade que se dignou suportá-lo e perdoá-lo e o pensamento dos sofrimentos e da morte do Redentor. 

A alma iniciada no dom de Piedade deseja constantemente a glória de Deus; quer pôr todos os homens a seus pés e os ultrajes que Ele recebe lhe são particularmente sensíveis. Sua alegria é ver o progresso das almas no amor e as devoções que este amor lhes inspira por Aquele que é o soberano Bem. Cheia de submissão filial para com o Pai universal que está nos céus, essa alma está pronta para todas as suas vontades. Resigna-se de coração com todas as disposições de sua Providência.

Sua fé é simples e viva. Mantém-se amorosamente submissa à Igreja, sempre pronta a renunciar às suas próprias idéias e àquelas mais caras, se estas afastam-se de alguma forma de seu ensinamento ou de sua prática, tendo um horror instintivo da novidade e da independência. Essa devoção para com Deus que o dom de Piedade inspira,unindo a alma a seu Criador pela afeição filial, a une, também, com uma afeição fraternal, a todas as criaturas, já que estas são obra do poder de Deus e que as são para Ele.

Em primeiro lugar, nas afeições do cristão animado pelo dom de Piedade, estão as criaturas glorificadas, das quais, Deus goza eternamente e as quais gozam Dele para sempre. Ama ternamente a Santíssima Virgem Maria e é zeloso de sua honra; venera com amor os santos e os atos heroicos de virtude realizados pelos amigos de Deus; delicia-se com seus milagres, honra religiosamente suas relíquias sagradas.

Mas sua afeição não é apenas pelas criaturas coroadas no céu; aquelas que ainda estão aqui embaixo ocupam um lugar importante em seu coração. O dom de Piedade faz com que ele encontre nelas o próprio Jesus. Sua boa vontade para com seus irmãos é universal. Seu coração está inclinado ao perdão das injúrias, a suportar as imperfeições do outro, a desculpar as imperfeições do próximo. É compassivo para com o pobre, solícito aos pés do doente. Uma doçura afetuosa revela o fundo do seu coração e em suas relações com os irmãos da terra, o vemos sempre disposto a chorar com os que choram, a se alegrar com os que se alegram.

Tal é, ó Divino Espírito, a disposição daqueles que cultivam o dom de Piedade que derramais em suas almas. Por esse inefável benefício, neutralizais o triste egoísmo que afloraria em seus corações, livrando-os de uma frieza odiosa que torna o homem indiferente a seus irmãos e fechais suas almas à inveja e ao ódio. Para isso, só foi preciso esta piedade filial para com seu Criador; que amoleceu seus corações, fundindo-os com uma viva afeição por tudo o que sai das mãos de Deus. 

Fazei frutificar em nós este Dom tão precioso, ó Divino Espírito! Não permitais que ele seja abafado pelo amor de nós mesmos. Jesus nos encorajou dizendo-nos que seu Pai Celeste 'faz o sol nascer sobre os bons e os maus'; não permitais, Divino Paráclito, que uma tão paternal indulgência seja um exemplo perdido para nós e dignai-Vos desenvolver em nossas almas o germe de devoção, de benevolência e de compaixão que Vos dignastes infundir no momento em que delas tomastes possessão pelo santo batismo.

(Excertos da obra 'Os Dons do Espírito Santo', de Dom Prosper Gueranger, Ed. Permanência, 2007)

domingo, 9 de fevereiro de 2014

SAL DA TERRA E LUZ DO MUNDO

Páginas do Evangelho - Quinto Domingo do Tempo Comum


Na missão de testemunhar com nossas vidas o Evangelho de Cristo, somos instados a deixar nos caminhos do mundo a marca característica da fé e dos valores cristãos. Os passos de um cristão marcham para o triunfo da Igreja; os caminhos são forjados pelo amor à Verdade; como peregrinos da eternidade, somos mensageiros e arautos da Boa Nova anunciada por Jesus. Somos cristãos espalhados no mundo mas, desde agora, herdeiros da Pátria Celeste.

Este propósito nos foi delegado por Jesus, no evangelho deste Quinto Domingo Comum: 'Vós sois o sal da terra' (Mt 5, 13). Sal capaz de dar sabor e sentido à vida de todos, em meio às labutas e sofrimentos humanos; sal capaz de conservar os valores e a integridade da Palavra de Deus no mundo afeito às glórias mais passageiras; sal capaz de condimentar o desvario, a vertigem e o entorpecimento de uma humanidade que insiste em se deleitar com a sedução do pecado.

Este legado nos foi outorgado por Jesus uma vez mais: 'Vós sois a luz do mundo' (Mt 5, 14). Luz para refletir no próximo a graça do Espírito Santo distribuída a todos; luz para fazer brilhar a verdade no meio de um mundo dominado pela mentira e pela manipulação dos costumes; luz para dar foco aos que vivem à deriva e acostumados às comodidades dos erros; luz para aniquilar a cegueira e a loucura que ensoberbecem os que tateiam nas trevas do pecado. 

Ai do cristão que, amesquinhado e omisso pelos valores do mundo, não for o sal que salga ou a luz que não ilumina! Como testemunhas do Senhor, mais que vocação, nossa missão no mundo é praticar o bem em todas as nossas ações, dando sabor e sentido à nossa vida e à vida de nossos irmãos, como reflexos diretos da Luz de Cristo, para honra e glória de Deus: 'Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus' (Mt 5, 16).

sábado, 8 de fevereiro de 2014

VERSUS: A MORTE DO JUSTO E A MORTE DO PECADOR


'Para um cristão, a morte não pode resultar amarga para a alma que ama, já que nela encontra toda a doçura e o deleite do amor. A alma goza da morte como se estivesse a pensar no seu noivado ou no seu matrimônio, por isso deseja o dia e a hora da sua morte.' (São João da Cruz).

'Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã nossa, a morte corporal, da qual nenhum homem vivente pode escapar. Ai daqueles que morrem em pecado mortal; bem aventurados os que ela encontrar na Tua Santíssima Vontade, porque a segunda morte não lhes fará mal.' (São Francisco de Assis) 

'Os tormentos que na morte afligem os pecadores, não afligem os santos: Non tanget illos tormentum mortis ― 'Não os tocará o tormento da morte'. Quem morre no amor de Deus, não se inquieta com as dores que acompanham a morte; antes, nelas se compraz pensando que a vida vai acabar e que depois não lhe resta mais tempo para sofrer por Deus e testemunhar-lhe outras provas do seu amor. Por isso, oferece-lhe com afeto e paz estes últimos restos da sua vida, e consola-se unindo o sacrifício da sua morte ao sacrifício que Jesus Cristo ofereceu um dia por ele na cruz ao seu eterno Pai. E assim morre feliz, dizendo: In pace in idipsum dormiam et requiescam (Sl 4, 8) ― 'Em paz dormirei nele e repousarei'. Oh! que felicidade morrer entregando-se e repousando nos braços de Jesus Cristo, que nos amou até à morte e quis sofrer uma morte tão dolorosa, afim de nos obter uma morte doce e cheia de consolação!' (Santo Afonso de Ligório) 

'Quando o Filho do Homem voltar na sua glória e todos os anjos com ele, sentar-se-á no seu trono glorioso. Todas as nações se reunirão diante dele e ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. Colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. Então o Rei dirá aos que estão à direita: - Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo ... Voltar-se-á em seguida para os da sua esquerda e lhes dirá: - Retirai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno destinado ao demônio e aos seus anjos' (Mt 25, 31 - 34, 41).


GALERIA DE ARTE SACRA (XI)

CATEDRAL DE LISIEUX

A Basílica de Lisieux, dedicada à Santa Teresa, é uma das maiores e mais imponentes igrejas do século XX. A sua construção começou em 1929 e sua consagração ocorreu em 1954, quase trinta anos mais tarde. Construída em forma de cruz latina, a igreja possui 18 altares menores que foram ofertados por diferentes nações (México Espanha, Itália, Ucrânia, Chile, Brasil, Argentina, Portugal, Estados-Unidos, Colômbia, Grã-Bretanha, Escócia, Alemanha, Cuba, Irlanda, Canada, Bélgica e Polônia). Além da cripta e das relíquias da santa, falecida em 1897, com apenas 24 anos, e canonizada em 1925, a igreja inclui ainda a cripta dos seus pais, Luís Martin e Zelia Guérin, também beatificados pela Igreja em 2008.








(cripta dos pais de Teresa)

(cripta de Santa Teresa de Lisieux)

DA VIDA ESPIRITUAL (66)

Quem poderá nos separar do amor de Deus? Releia e medite muitas vezes a mensagem de Paulo aos romanos (Rom 8, 37-39), para compreender um pouco do amor infinito do Pai por nós. Mesmo que uma hecatombe universal decretasse o fim de toda a humanidade e você, meu filho, fosse o único ser humano sobre a terra, Deus não te amaria nem mais um pouquinho do que te ama agora, neste momento, porque Ele é o Infinito Amor e te escolheu entre os Filhos da Luz desde os tempos do Nada. Este Amor subsiste apenas pelo teu amor: as chamas do Amor Infinito que incendeiam tua alma se alimentam das fagulhas esmaecidas do teu limitado amor humano ... Estas chamas retornam como fogo abrasador forjado pelos reflexos da própria Luz de Deus no espelho de tua alma generosa e pura...