sábado, 15 de novembro de 2025

POEMAS PARA REZAR (LXII)

 

CONVERSÃO

Ai de mim que ando distraído
sem saber onde minha alma está
Ando comprando rumores e vertigens
a preço vil na mundana e louca lida
e desconheço as coisas que os anjos falam
no silêncio das noites que não me acalentam mais.

Tem um ai em mim que dói a cada passo
que causa espanto ao andarilho que me assombra
que tenta me convencer dois passos atrás
quando eu só enxergo o que vejo longe...
Que mortalha é essa que me pesa os ombros 
e estas correntes que me prendem as mãos?

Ai de mim que não encontro salmos
nem as orações que minha mãe fazia
tem um perfume que ainda me acompanha
daquelas rosas aos pés da Senhora dela
que eram só delas porque de tão esquecidas
na verdade nunca foram minhas.

Esse ai me dói nos joelhos e dentro do peito
como uma cicatriz que transpõe meus membros
aquele verniz de felicidade sem fartura
é minha máscara que se mostra mais querida
comungo as sandices destes homens
que creem que são deuses de si mesmos...

Ai de mim que insisto em não ter tempo
para assombrar as masmorras do meu peito
e me deleito em usufruir das sombras
que esmagam o que pensei nunca ter sido
Ó luz difusa, erma, e docemente amarga,
onde eu posso beber o cálice da água viva?

Esse ai sacode e inquieta meu coração selvagem
e sopra em meus ouvidos o cântico dos cânticos
e já não sou eu que vivo agora em mim.
Ó luz bendita, bendita luz que me ilumina,
imola a minha dor aos pés da Cruz bendita
e toma minha alma como posse Senhora minha! 

(Arcos de Pilares)

sexta-feira, 14 de novembro de 2025

SOBRE A JUSTIÇA E A MISERICÓRDIA

A fortaleza da qual tenho te falado é a Santa Igreja, que construí com meu próprio sangue e o dos santos. Eu mesmo a cimentei com minha caridade e depois coloquei nela meus eleitos e amigos. Seu fundamento é a fé, ou seja, a crença em que sou um Juiz justo e misericordioso. Este fundamento tem sido agora deturpado porque todos creem e pregam que sou misericordioso, mas quase ninguém crê que Eu seja um Juiz justo. Consideram-me um juiz iníquo. 

De fato, um juiz seria iníquo se, à margem da misericórdia, deixasse os maus sem castigo de forma que pudessem continuar oprimindo os justos Eu, porém sou um Juiz justo e misericordioso e não deixarei que o mínimo pecado fique sem castigo nem que o menor bem fique sem recompensa. Pelos buracos perfurados no muro, entram na Santa Igreja pessoas que pecam sem medo, que negam que Eu seja justo e atormentam meus amigos como se os cravassem em estacas. 

A estes meus amigos não se dá alegria nem consolo. Pelo contrário, são castigados e injuriados como se fossem demônios. Quando dizem a verdade sobre mim, são silenciados e acusados de mentir. Eles anseiam com paixão ouvir ou falar a verdade, mas não há ninguém que os escute nem quem lhes diga a verdade. Além disso, Eu, Deus Criador, estou sendo blasfemado. As pessoas dizem: 'Não sabemos se Deus existe. E, se existe, não nos importa'. Jogam no chão minha doutrina e a pisoteiam dizendo: 'Por que sofreu? Em que nos beneficia? Se cumpre nossos desejos estaremos satisfeitos, que mantenha Ele o seu reino no Céu!'

Quando quero achegar deles, dizem: 'Antes morrermos que submetermos a Vós a nossa vontade!' Dá-te conta, esposa minha, que tipo é essa gente? Eu os criei e posso destruí-los com uma palavra! Que soberbos são para comigo! Graças aos rogos de minha Mãe e de todos os santos, permaneço misericordioso e tão paciente que estou desejando enviar-lhes palavras da minha boca e oferecer-lhes misericórdia. Se a quiserem aceitar, terei compaixão Do contrário, conhecerão minha justiça e, como ladrões, serão publicamente envergonhados diante dos anjos e dos homens e condenados por cada um deles. 

Como os criminosos são colocados nas forcas e devorados pelos corvos, assim eles serão devorados pelos demônios, mas não serão consumidos. Como as pessoas amarradas em cepos não podem descansar, eles padecerão dor e amargura em todas as partes. Um rio de fogo entrará por suas bocas, mas seus estômagos não serão saciados e sua sede e suplício se reavivarão a cada dia. Porém, meus amigos estarão a salvo, e serão consolados pelas palavras que saem de minha boca. Eles verão minha justiça junto de minha misericórdia. Revesti-los-ei com as armas do meu amor, que os tornarão tão fortes que os adversários da fé se desmancharão diante deles como barro; quando virem minha justiça, cairão em vergonha perpétua por haverem abusado de minha paciência.

(Excertos da obra 'As Profecias e Revelações de Santa Brígida da Suécia')

quinta-feira, 13 de novembro de 2025

ORAÇÃO: SICUT CERVUS

Sicut Cervus - Como o Cervo - compreende a parte inicial de um famoso moteto de Giovanni Pierluigi da Palestrina (1525 - 1594). A composição completa inclui uma segunda parte Sitivit Anima Mea - A minha alma tem sede - ambas baseadas no Salmo 41 (42). Sicut Cervus expressa o anseio da alma por Deus, comparando-o com a sede do cervo por água. É uma obra-prima da polifonia renascentista e é cantada em celebrações litúrgicas, particularmente durante a Bênção da Fonte Batismal no Sábado Santo (o cervo é uma figura do catecúmeno - pessoa que está sendo instruída na fé cristã para receber o batismo). 


I. Sicut cervus desiderat ad fontes aquarum:
Ita desiderat anima mea ad te, Deus.

 II. Sitivit anima mea ad Deum vivum:
Quando veniam et apparabo
Ante faciem Dei mei?

Fuerunt mihi lacrimae
Meae panes die ac nocte,
Dum dicitur mihi per singulos dies:
Ubi est Deus tuus?

🎵🎵🎵🎵🎵

I. Como o cervo anseia pelas fontes das águas,
assim por vós, ó Deus, suspira a minha alma.

II. A minha alma teve sede do Deus vivo;
Quando poderei vir e comparecer
ante a face de Deus?

As minhas lágrimas foram
o meu pão dia e noite,
enquanto me perguntam cada dia:
onde está o teu Deus?

quarta-feira, 12 de novembro de 2025

ORAÇÃO À MÃE DE MISERICÓRDIA


Ó Maria, advogada dos pecadores, intercedei em meu favor. Lembrai-vos de que é para a nossa felicidade também, e não só para a vossa, que recebestes o grande poder e dignidade de que sois revestida. Se um Deus se dignou de fazer-se o vosso devedor pela natureza humana que de vós assumiu, é para que possais dispender ao vosso grado os tesouros da divina misericórdia. 

Vossos servos somos, dedicados de maneira especial ao vosso serviço, e nos gloriamos de viver sob a vossa proteção. Se fazeis bem a todos os homens, ainda aos que não vos conhecem ou se descuidam de honrar-vos, assim como aos que vos ultrajam e blasfemam, que não devemos esperar de tão grande bondade que busca os desgraçados para os socorrer, nós que vos honramos, amamos e em vós pomos toda a nossa confiança?

Grandes pecadores somos, mas Deus vos deu uma misericórdia e poder que ultrapassam as nossas iniquidades. Vós tendes o poder e a vontade de nos salvar, e nós tanto mais queremos esperar a nossa salvação, quanto mais indignos dela somos, para mais vos glorificar no céu, quando lá entrarmos pela vossa intercessão. 

Ó Mãe de misericórdia, nós vos apresentamos as nossas almas, que o sangue de Jesus Cristo havia outrora lavado e moldado de graça, mas que o pecado depois horrivelmente manchou; a vós pertence purificá-las. Alcançai-nos uma conversão sincera, o amor de Deus, a perseverança, o Paraíso. Grandes graças vos pedimos; mas não podeis obter tudo? Seria muito para o amor que Deus vos tem? Bastante vos é pedir ao vosso Filho: Ele não vos recusa coisa alguma. Rogai então, ó Maria, rogai por nós: e sereis atendida e nós infalivelmente salvos.

(As Mais Belas Orações de Santo Afonso de Ligório, do Pe. Saint-Omer)

terça-feira, 11 de novembro de 2025

'MESMO QUE APENAS UM SEJA SALVO...'

Que a Fé dos nossos Pais seja proposta àqueles que estão enganados, mas de boa vontade, com toda ternura e caridade. Se eles concordarem, recebamo-los em nosso meio. Se eles não concordarem, habitemos sozinhos, independentemente de números; e mantenhamo-nos afastados de almas equivocadas, que não possuem aquela simplicidade sem dolo, indispensavelmente necessária nos primeiros dias do Evangelho.

Os crentes, como está escrito nas Escrituras, tinham apenas um coração e uma alma. Portanto, aqueles que nos censuram por não desejar a pacificação, marquem bem quem são os verdadeiros autores da perturbação. Que eles não peçam mais reconciliação de nossa parte.

A todo argumento especioso que pareça aconselhar silêncio de nossa parte, opomos este outro argumento, a saber, que a caridade não conta como nada, nem seus próprios interesses nem as dificuldades dos tempos. Mesmo que nenhum homem esteja disposto a seguir nosso exemplo, o que fazer então? Devemos abandonar o dever somente por essa razão? Na fornalha ardente, os filhos do cativeiro da Babilônia entoaram seu cântico ao Senhor, sem fazer nenhuma avaliação da multidão que deixou a verdade de lado. Eles eram suficientes um para o outro, apenas três como eles eram!

Então, animem-se! sob cada golpe, renovem-se no amor; deixem seu zelo ganhar força a cada dia, sabendo que em vocês devem ser preservados os últimos resquícios de piedade que o Senhor, em seu retorno, pode encontrar na terra. 

Não deem atenção ao que a multidão pode pensar, pois um mero sopro de vento é suficiente para balançar a multidão para frente e para trás, como a onda ondulante. Mesmo que apenas um fosse salvo, como no caso de Ló de Sodoma, não seria lícito para ele se desviar do caminho da retidão, meramente porque ele descobre que ele é o único que está certo. Não; ele deve ficar sozinho, impassível, mantendo firme sua esperança em Jesus Cristo.

(São Basílio de Cesaréia)

segunda-feira, 10 de novembro de 2025

PALAVRAS DA SALVAÇÃO

'Trema a criatura perante o suplício do seu Redentor, quebrem-se as pedras dos corações infiéis e saiam para fora, vencendo todos os obstáculos, aqueles que jaziam debaixo de seus túmulos. Apareçam também agora na cidade santa, isto é, na Igreja de Deus, como sinais da ressurreição futura e realize-se nos corações o que um dia se realizará nos corpos. A nenhum pecador é negada a vitória da cruz e não há homem a quem a oração de Cristo não ajude. Se ela foi útil para muitos dos que o perseguiam, quanto mais não ajudará os que a ele se convertem? Foi eliminada a ignorância da incredulidade, foi suavizada a aspereza do caminho, e o sangue sagrado de Cristo extinguiu o fogo daquela espada que impedia o acesso ao reino da vida. A escuridão da antiga noite cedeu lugar à verdadeira luz. O povo cristão é convidado a gozar as riquezas do paraíso, e para todos os batizados está aberto o caminho de volta à pátria perdida, desde que ninguém queira fechar para si próprio aquele caminho que se abriu também à fé do ladrão arrependido. Evitemos que as preocupações desta vida nos envolvam na ansiedade e no orgulho, de tal modo que procuremos, com todo o afeto do coração, conformar-nos ao nosso Redentor na perfeita imitação dos seus exemplos'.

(São Leão Magno)

domingo, 9 de novembro de 2025

EVANGELHO DO DOMINGO

   

'Os braços de um rio vêm trazer alegria à cidade de Deus, à morada do Altíssimo' (Sl 45)

Primeira Leitura (Ez 47,1-2.8-9.12) -Segunda Leitura (1Cor 3,9c-11.16-17) - Evangelho (Jo 2,13-22)

  09/11/2025 - DEDICAÇÃO DA BASÍLICA DO LATRÃO

A EXPULSÃO DOS VENDILHÕES DO TEMPLO


Neste domingo, o Evangelho nos mostra Jesus manifestando aos ímpios a ira santa de Deus. Há pouco, ocorrera o milagre das Bodas de Caná; estava próxima a Páscoa e, em perfeita conformidade à lei judaica, Jesus também viera visitar o Templo em Jerusalém. E ali, num ambiente tomado por uma completa profanação do espaço sagrado, Jesus expulsa os vendilhões do templo.

Tomado de santo furor, diante a balbúrdia e o tumulto dos homens que profanavam o santuário de Deus, Jesus faz um chicote de cordas e os expulsa com peremptória indignação: 'Tirai isto daqui! Não façais da casa de meu Pai uma casa de comércio!' (Jo 2,16). Aquelas mãos divinas, consumidas em tantos atos de perdão e de misericórdia, tecem agora um chicote! E, com ele em mãos, golpeia e desmantela as bancas e as mesas, espanta vendedores e cambistas, afugenta os animais em correria, esparrama objetos, moedas e víveres pelo chão, movido por uma indignação e um zelo extremos pela profanação do sagrado. O que deve ter sido este cenário!

Paralisados e tomados de pavor, aqueles homens que se atropelam para fugir diante de Jesus e da profanação revelada, ainda ousam pedir um sinal ao Senhor por tais ações. E Jesus lhes dá a resposta pela revelação do mistério da ressurreição do seu corpo, templo perfeitíssimo de Deus: 'Destruí este Templo, e em três dias o levantarei (Jo 2,19). Jesus não falava do templo físico, mas do templo espiritual que habita em nós, e que contém em plenitude o Corpo, Sangue, Alma e Divindade do Senhor. O primeiro será destruído, porque não era santo. O segundo, por méritos e graças do Salvador, nos abriu as portas da redenção e da eternidade com Deus: 'Quando Jesus ressuscitou, os discípulos lembraram-se do que ele tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra dele' (Jo 2,22).

O episódio da expulsão dos vendilhões do Templo deveria nos alertar duramente sobre o rigor da Justiça Divina, diante o pecado e a perda de referência ao culto do sagrado. Ai daqueles que, usurpando da graça do livre arbítrio, negam a sua realidade espiritual e convertem as suas vidas em construir templos de barro e produzir frutos sazonais, ditados apenas pelos interesses humanos. Serão réus e depositários da santa ira de Deus, porque 'se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá, pois o santuário de Deus é santo e vós sois esse santuário' (1Cor 3,17).