sexta-feira, 16 de agosto de 2019

DA PRÁTICA DA CARIDADE PELO SERVIÇO

1. Quanto a caridade que deveis praticar nas vossas ações, procurai estar dispostas a servir vossas irmãs em todas as suas necessidades [o texto foi dirigido originalmente à orientação espiritual de religiosas]. Algumas religiosas dizem que amam suas irmãs e que as conservam todas no coração, mas não querem incomodar-se em coisa alguma por seu amor. Esquecem-se do que o apóstolo São João escreveu aos seus discípulos: 'Filhinhos, não amemos com as palavras e com a língua, mas com obras e verdade' (1Jo 3,18).

Para satisfazer a caridade, não basta amar o próximo somente com palavras, é preciso amá-lo também com fatos. Todos os santos, diz o Sábio, são cheios de caridade e de compaixão para com aqueles que tem necessidade de seus socorros (Pv 13, 13). Escreve-se de Santa Teresa que ela procurava todos os dias praticar algum ato de caridade com suas irmãs e, quando alguma vez o não fazia durante o dia, procurava fazê-lo à noite, ao menos saindo da sua cela com a candeia, para fornecer luz às monjas que passavam no escuro diante dela

2. Quando puderdes fazer alguma esmola do vosso pecúlio, fazei-a. A sagrada Escritura diz que a esmola livra o homem da morte, o purifica dos pecados e lhe alcança a misericórdia divina e a salvação eterna (Tb 12,9). E reflete São Cipriano que nada há que o Senhor recomende tanto como a esmola, nas Sagradas Escrituras. 

3. Por esmola não se entende somente o dinheiro e os objetos materiais, mas também todo o alívio que se dá ao próximo necessitado desse auxílio. 'Como pode ufanar-se de ter caridade', pergunta São João, 'aquele que vendo seu irmão na necessidade, lhe fecha suas entranhas, e lhe não vem em auxílio, quando pode?' (1Jo 3,17). A religiosa faz uma esmola muito agradável a Deus, quando ajuda suas irmãs nos seus trabalhos. Santa Teodora, religiosa, procurava ajudar todas as irmãs nos seus ofícios, e evitava ao contrário que as outras a ajudassem no seu. 

Santa Maria Madalena de Pazzi, quando havia algum trabalho extraordinário para se fazer, logo se oferecia para fazê-lo sozinha; e depois ajudava as outras em todos os ofícios mais penosos, pelo que era voz corrente no convento que só ela trabalhava mais do que quatro irmãs conversas. Procurai também vos proceder desse modo, quanto for possível, e quando vos achardes cansadas, olhai para o divino esposo levando a cruz às costas, e abraçai alegremente vosso novo trabalho. O Senhor virá em vosso auxílio, quando ajudardes as vossas irmãs. 

Ele mesmo o disse: 'Pela medida com que houverdes medido, sereis medidos (Mt 7,2). Donde conclui São João Crisóstomo que a prática da caridade é uma arte muito lucrativa e o meio de ganhar muito diante de Deus . E Santa Maria Madalena de Pazzi se achava mais feliz socorrendo o próximo do que gozando na contemplação, pois como dizia: 'Quando estou em contemplação, é Deus que me auxilia e quando socorro o próximo, sou eu que ajudo a Deus'. O divino Salvador, com efeito, declarou que o bem que fazemos ao próximo, nós o fazemos a ele mesmo (Mt 25, 40).

4. Mas prestando serviços às irmãs, não deveis esperar delas nenhuma recompensa nem agradecimento. Regozijai-vos antes, se, em vez de agradecimentos, receberdes desatenções e censuras; porque, então, lucrareis uma dupla vantagem. É também um ato de caridade condescender com os pedidos honestos que vos fizerem vossas irmãs. Mas isto sempre se entende, contanto que o pedido não prejudique o vosso adiantamento espiritual; por exemplo: se a irmã quisesse que omitísseis os vossos exercícios de piedade, sem outro motivo que ficar a conversar com ela para lhe comprazer; nesse caso, é melhor que cuideis dos vossos afazeres. A caridade é bem ordenada, como diz a Esposa dos Cânticos (Ct 2,4). Não há pois caridade naquilo que prejudica o vosso bem espiritual ou o de vossa irmã. 

(Excertos da obra 'A Verdadeira Esposa de Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)